Abril - 2023 - Edição 290
O fim da cultura
Como se fosse uma obrigação,
todas as vezes que fui a São Paulo, nos
últimos anos, visitei a Livraria Cultura,
na Avenida Paulista. Era uma forma de
me manter em dia com os lançamentos
literários, o que é muito importante
para um homem com o meu tipo de atividades profissionais.
Agora isso deixará de existir, em virtude do fechamento daquele
famoso espaço. É de se lamentar que isso tenha ocorrido, pondo
fim ao sonho da família Herz.
É muito triste ver as fotos das estantes esvaziadas no
Conjunto Nacional, depois de decretação da falência da loja. Na
sentença, o juiz afirmou que o grupo não conseguiu superar a sua
crise econômica. Tem uma dívida declarada de 285 milhões de
reais, entre aluguéis e prestações de contas, inclusive dívidas trabalhistas. Há diversas editoras com o registro de créditos enormes,
como a Record, a Companhia das Letras, a Sextante, a Panini e a
Intrínseca. São 76 editoras brasileiras como credoras somente no
Rio de Janeiro. A empresa pode (e vai recorrer), mas sabe-se que é
um processo demorado.
A administração da livraria apontou diversas causas principais para justificar esse fato profundamente lamentável: altos custos de produção, queda na demanda por livros, falta de interesse
por leitura e a nossa profunda crise econômica desde 2014. É claro
que estamos vivendo uma nova realidade pedagógica, com outros
e revolucionários formatos de transmissão de conhecimento. Isso
naturalmente teria que provocar consequências.
No Rio, praticamente ao mesmo tempo, fechou outra livraria tradicional em Ipanema: a Galileu Galilei. Não se tem como
comemorar tais fatos, pois abalam o nosso arcabouço cultural.
O triste, nisso tudo, é que não existe nenhuma reação por parte
dos governos, de qualquer instância. Já existe, é certo, um novo
Ministério da Cultura, mas ninguém soube de qualquer reação
das novas autoridades a propósito do assunto. Um país com mais
de 60 milhões de estudantes não pode sobreviver sem bibliotecas
e livrarias compatíveis com o seu tamanho e as suas perspectivas
de crescimento. Assistir a isso tudo de forma silenciosa é o que de
pior pode acontecer. Está mais do que na hora de protestar contra
esse tipo de descaso com o nosso futuro.