Julho - 2022 - Edição 281
O veto a Nise da Silveira
Quando frequentei a Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras da então UDF
(hoje, UERJ), tive um amigo que jamais
esqueci: Luís Paiva de Castro. Ele fazia o
curso de História, mas também era aluno da
Faculdade de Ciências Médicas. Ser doutor
era também o seu sonho.
Numa das nossas conversas, ele me falou da Dra. Nise da Silveira
(1905-1999). Era um entusiasta das ações desenvolvidas na Casa das
Palmeiras, aberta por Nise em 1956, com o objetivo de reabilitar sem
internação. Investiu seriamente no processo criativo e afetivo dos seus
pacientes. Médica psiquiatra, foi quem introduziu o contato com cães e
gatos nos seus estudos.
Entre 1936 e 1937, durante o Estado Novo de Getúlio Vargas, foi
presa sob a acusação de praticar o comunismo, embora na verdade
fosse discípula do famoso psiquiatra suíço Carl Gustav Jung, que não
tinha nada de simpatizante dessa teoria. Sua preocupação era outra:
o combate aos métodos aplicados em manicômios a pacientes com
transtornos mentais, com o emprego de eletrochoques, lobotomia e o
confinamento.
Contra esses absurdos, Nise preconizava o emprego da arte,
em especial a pintura. Muitas obras estão hoje expostas no Museu de
Imagens do Inconsciente, no Rio, e Nise assim se tornou uma figura de
destaque internacional. Lembro bem, como chefe de reportagem da
revista Manchete, de algumas matérias que sugeri sobre esse notável
trabalho.
Hoje, a deputada Jandira Fegali, que é médica, sugeriu o nome
de Nise da Silveira para ser colocado no livro de heróis da pátria. Nada
mais merecido, mas o presidente da República vetou a homenagem,
alegando razões ideológicas. Não levou em conta o trabalho de Nise no
tratamento de transtornos mentais, com plena aprovação por parte do
Senado da República. Prevaleceu uma razão mesquinha e ultrapassada.
Na história do Brasil, a médica alagoana será sempre lembrada
como figura central de humanização de manicômios e hospitais psiquiátricos. Isso é o que importa.