Novembro - 2020 - Edição 261
Amor à Matemática
Quem conheceu o professor Bayard
Demaria Boiteux, como foi o nosso caso, não
pode deixar de reconhecer o seu profundo
amor pela Matemática. Era com esse sentimento que ele lecionava Cálculo Vetorial
e Geometria Analítica, na então Universidade do Distrito Federal (na
altura dos anos 1950). Suas aulas eram muito apreciadas pelos alunos
dos cursos de Matemática, Física e Química.
Na época, comenta-se que tinha um exemplar quadro-negro.
Sabia distribuir a matéria, com os seus naturais mistérios, na chamada
lousa, de tal forma que as questões complicadas acabavam se tornando mais simples. Isso ajudava os seus alunos a compreender melhor (e
mais rápido) o significado da ciência do raciocínio.
Além disso, o mestre era uma figura extremamente simpática. Não
havia quem não o admirasse. Por isso mesmo, foi com surpresa e desagrado que os seus alunos souberam da sua cassação, depois do movimento de 1964, por motivos políticos. Toda a Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras, da qual ele era um expoente, se revoltou quando
Bayard foi obrigado a deixar o magistério. O motivo foi puramente político. Ele era dirigente do Sindicato dos Professores.
Na época, eu estava completando o meu curso de Matemática.
Numa determinada tarde, fui chamado à presença do diretor Ney
Cidade Palmeiro, que já era desembargador, para uma conversa a sós.
Passando a mão pelo meu ombro, o diretor fez o convite que mudou a
minha vida: “Você não quer ser professor de Geometria Analítica, na
vaga que pertenceu ao professor Bayard Boiteux?” Pensei na injustiça
que autoridades federais haviam cometido contra o nosso querido professor, mas não tinha força para ir contra a realidade. Pensei duas vezes
e aceitei o encargo, honrado pela oportunidade de seguir as lições de
mestre Bayard. Foi o que tentei fazer durante alguns anos.
Mais tarde, na condição de secretário de Estado de Educação do
Rio de Janeiro, tive uma oportunidade única: poderia, com uma canetada, devolver a matrícula ao meu estimado professor, que também
atuava na rede pública de ensino. Assinei, com muito gosto, a sua volta
ao magistério oficial. Poderia ter protelado a decisão, mas não quis que
isso acontecesse. Já bastava a interrupção havida, que, no íntimo, era de
uma arbitrariedade absurda.
Hoje, estou sendo homenageado pelo seu filho, de mesmo nome,
com a outorga do Prêmio Yedda Maria Teixeira. É uma honraria que me
faz lembrar a figura do mestre injustiçado.