Educação e cultura ou morte
Ao arrumar a estante para o novo ano, encontrei um texto do querido Alcione Araújo (1945-2012) cujo título forte me fez largar a faxina
e reviver a voz grossa e o jeito manso do amigo querido, dramaturgo,
autor, intelectual brilhante. Um texto de 2002, cuja atualidade nos
comove. Ao final, o autor elogia e amplia a esperança nas iniciativas
independentes, voltadas para a educação e a cultura, na formação de
cidadão, de seres humanos, completos, plenos.
Tomei a liberdade de extrair algumas ideias, que certamente também emocionarão ao leitor.
“Eu sonho com um Brasil no qual a educação e a cultura sejam
entendidos como frutos da mesma árvore sagrada do conhecimento.
Cultura é tudo o que foi tocado pela mão e pelo espírito criador do
homem.
A educação, que nos aproxima da ciência e da tecnologia, deveria
nos aproximar também das artes.
Assim como a racionalidade é indispensável para compreender o
homem, sua história e a utilização que faz da natureza, a sensibilidade
também é indispensável para abrir as portas da percepção do mundo
simbólico, do acesso à produção do imaginário, da subjetividade e das
emoções.
Investir na educação e na cultura permite entrarmos, de fato, no
século XXI. Porque a cultura começa na escola. Assim, a educação ganha
um significado mais profundo e mais amplo, porque vai formar profissionais, cidadãos e seres humanos.
A educação, entendida exclusivamente como formação profissional, abandonando a formação do cidadão e do ser humano, fica reduzida
ao papel subalterno de adestramento para a produção, preparação de
mão de obra amesquinhada, linha auxiliar de acirramento da já perversa concentração de renda.
Da mesma forma que a cultura não pode resignar-se às migalhas
que caem da mesa do poder, interessado apenas na exploração marqueteira dos valores do espírito. A cultura oficial tem sido fachada para a
ambição de suntuosas nulidades ou ao narcisismo de obscuros serviçais.
O que dá algum alento é surgirem atores sem outros interesses que
não o de contribuir para trazer mais luz aos jovens. Eles beneficiarão
todos com um saber transformador da realidade, ao mesmo tempo que
serão mais sensíveis, mais humanos e mais profundos – justamente pela
percepção do novo mundo, sugerida pela arte e a cultura. Esta é a educação que desvela a arte e descobre a cultura, que gera um homem novo,
um novo país. Quero sonhar que esta ideia generosa e transformadora há
de se espalhar por aí.”
Facev – Campus da Universidade Federal de Viçosa. ARAÚJO, Alcione. In: Pé na estrada. Programa TIM ArtEducação. MG – Grandes Escritores. Belo Horizonte: Sografe, 2002 (nov). p.27-30. E continuamos teimando e lutando por uma educação de qualidade e o acesso à cultura para sermos um país do século XXI! Para comemorar o ano que se inicia, cheios de esperança, parabenizamos os premiados na categoria Literatura Infantil da Fundação Biblioteca Nacional: Volnei Canonica, autor, e Roger Ycasa, ilustrador, com a obra Tanta Chuva no Céu (Editora do Brasil). Sagatrissuinorana (Editora ÔZÉ), de João Luis Guimarães e ilustrado por Nelson Cruz (Prêmio de ilustração), recebeu o título de Livro do Ano no Prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro - CBL.
Sugestões de leitura:
Metamorfoses – Quatro autoras: Flávia Côrtes (Lembranças), Flávia Muniz (Trevas), Regina Drummond (Criatura) e Rosana Rios (Guardião) apresentam contos com a metamorfose dos personagens. As incríveis ilustrações do mágico Salmo Dansa formam flip books com cada uma das histórias e o movimento de folhear as páginas cria o efeito precursor do cinema. Os contos (e desenhos) são de arrepiar! (Editora Lê).
Heróis e Heroínas do Cordel – Organizado por Januária Cristina Alves e com ilustrações de Salmo Dansa (Companhia das Letrinhas), apresenta cinco narrativas de grandes nomes da literatura de cordel selecionadas pela organizadora e ilustradas por Salmo: A história de João Valentão e o dragão de três cabeças, História da imperatriz Porcina, História de Roberto do Diabo, História da donzela Teodora e O verdadeiro romance do herói João de Calais. Heróis e heroínas astutos e inteligentes que superam desafios e contam uma boa história.
O Menino que Inventou o Sertão – Alexandre Azevedo presta uma linda homenagem ao autor mineiro Guimarães Rosa e Demóstenes ilustra com exuberância as paisagens da sua terra. O texto foi inspirado em frases extraídas de diferentes obras de Guimarães Rosa, listadas ao final. Uma bela e sensível homenagem ao autor e ao seu sertão (Editora Lê).