Março, 2025 - Edição 305

O dom marcante de Léo Batista

Decorridos 19 dias do primeiro mês deste ano, o Brasil recebeu com tristeza a notícia da morte de um dos pioneiros e maiores nomes da história da comunicação do país. O locutor esportista Léo Batista morreu aos 92 anos, deixando um legado de competência, profissionalismo, carisma e simpatia entre os fãs. O ícone do jornalismo esportivo fora internado no Hospital Rio D’Or, no Rio de Janeiro, no dia 6 de janeiro. Lutando contra um tumor no pâncreas, resistiu por 13 dias.

Nascido em 1932, em Cordeirópolis (SP), Léo Batista participou de momentos inesquecíveis da sociedade brasileira ao longo de quase 80 anos de carreira. Foi o primeiro jornalista, por exemplo, a informar o suicídio de Getúlio Vargas, em 1954, na Rádio Globo. Quarenta anos depois, na TV Globo, anunciou a morte de Ayrton Senna horas após o acidente em Ímola, na Itália.

Batizado com o nome de João Baptista Bellinaso Neto pelos pais, que eram imigrantes italianos, ainda menino começou a carreira de forma improvisada. Em um canto da casa, passou a usar uma latinha de tomate como microfone, imitando transmissões esportivas. Não demorou para que sua voz e talento chamassem atenção. Aos 15 anos, por indicação de um primo, inscreveu-se – e foi aprovado – para trabalhar no serviço de alto-falante da cidade. Pouco depois, mudou-se para Birigui e conseguiu vaga na Rádio Clube da cidade paulista. Começou a transmitir jogos de futebol e chegou a assumir função de gerência.

Trabalhou também em Piracicaba antes de chegar ao Rio de Janeiro, em 1952, para ingressar na Rádio Globo. Em terras cariocas, logo passou por uma mudança importante. O jornalista Luiz Mendes achava complicado o nome Bellinaso Neto, usado profissionalmente pelo recém-chegado. Sugeriu uma mudança, ideia acatada de imediato. Surgiu, a partir daquele momento, o aclamado Léo Batista.

Em 1955, apareceu a primeira oportunidade na televisão. Mesmo assustado pela falta de intimidade com o veículo, não se intimidou e passou a trabalhar na TV Rio. Participou da TV Rio Ring, fazendo sucesso com transmissões de lutas de Box. Entre as vivências históricas de sua carreira, esteve presente na primeira transmissão interestadual da televisão brasileira. A partida foi um Brasil e Itália, em 1956, no Maracanã.

Enquanto ganhava intimidade com a televisão, atuava também em outras áreas. Nas lutas de boxe, era o responsável por chamar os lutadores ao ringue e por anunciar o resultado, ao fim do combate.

Na TV, a carreira não parou de crescer. Passou também pela TV Excelsior antes de chegar à Globo, em 1970. Na empresa, Léo Batista foi um precursor de quase todos os programas esportivos. Participou do surgimento do Esporte Espetacular, em 1973, e apresentou o Copa Brasil, que deu origem ao Globo Esporte, em 1978.

Léo atuou também na grade da programação fora do esporte, apresentando, por exemplo, o Jornal Nacional, o Jornal Hoje e vários desfiles do Carnaval carioca.

Foi no Fantástico, no entanto, que ele deixou sua marca de maneira mais impactante. Primeiro, ao anunciar os resultados da loteria esportiva ao lado de uma zebrinha. Depois, com o surgimento do quadro Gols do Fantástico, desenvolveu um talento que carregou por décadas: a descrição de gols na televisão. Em diversos programas da Globo, a voz marcante do profissional acompanhou a exibição de gols marcados ao longo de muitos anos. Cenas inesquecíveis do esporte brasileiro também foram narradas pelo jornalista no Baú do Esporte. Em mais de 50 anos de trajetória na TV Globo, o declarado botafoguense se tornou sinônimo de esporte. Cobriu Copas do Mundo, Olimpíadas, corridas de Fórmula 1 e apresentou os principais programas do canal. Não foram poucas as homenagens recebidas em vida. No Estádio Nilton Santos, a cabine de imprensa foi batizada com seu nome.

Em 2024, foi homenageado pela TV Globo e se tornou uma série documental – “Léo Batista, a Voz Marcante” (*leia abaixo). Na nota de falecimento do ícone do jornalismo esportivo, lia-se a informação: “Léo Batista trabalhou com o que gostava até praticamente os últimos dias de sua vida.” Apesar da idade, manteve-se disposto e fez questão de continuar em atividade. Só queria parar de trabalhar quando não tivesse mais condições. Assim, participou do Globo Esporte até pouco antes de morrer, no dia 26 de dezembro, sua última gravação.

Ao descrever sua profissão, Léo Batista ensinou a receita necessária para alcançar o sucesso: Gosto, dom e treino. Características que ele reuniu de sobra.




Uma série documental imperdível

A carreira de Léo Batista se confunde com a história do jornalismo esportivo brasileiro. Para contar a trajetória do mais antigo apresentador em atividade da televisão brasileira, cuja voz está gravada na memória afetiva de milhões de pessoas, o Sportv produziu, em parceria com a produtora Imaginar, a série Leo Batista, A Voz Marcante (disponível no Globoplay). Dividida em quatro episódios, dirigida pela jornalista KizzyMagalhães, a série ouve amigos, companheiros de profissão e revela uma parte de sua vida pessoal que pouca gente conhece: as versões cantor, artista plástico, comediante e escritor. “Foi um privilégio contar a história de Léo Batista e fazer esta homenagem a ele. Muito além da voz, a trajetória dele é marcante. E a gente quis mostrar como ele se reinventou ao longo de tantas décadas”, declarou a diretora sobre o passeio pelos 76 anos de uma carreira cheia de histórias surpreendentes e relatos emocionantes, especialmente dos colegas de profissão que falam dele com muito carinho e respeito: “‘Seu Léo’ nos brindou com uma memória prodigiosa e nos conduziu a uma verdadeira viagem no tempo”.

O episódio de estreia mostra como o ícone do jornalismo esportivo viu o que era vanguarda virar coisa do passado. Na rádio, viveu intensamente a “Era do Ouro”, passando pelas principais emissoras do Brasil. E quando poucos acreditavam no sucesso da televisão, ele apostou neste novo meio de comunicação e virou figura onipresente nas telinhas do Brasil. Já na TV Globo, testemunha a chegada da TV a cores e, aos 80 anos, aparece em um programa na internet, encarnando um verdadeiro youtuber.

O segundo capítulo trata da sua trajetória na TV Globo e como sua voz ilustrou alguns dos grandes momentos do esporte brasileiro. O penúltimo episódio relembra momentos que mudaram a história do Brasil e do mundo, e que foram noticiados por ele, como a morte do presidente Getúlio Vargas e os acidentes fatais de Ayrton Senna e da Princesa Diana. No último episódio, a série traz revelações surpreendentes e mostra outras facetas. Familiares relembram passagens importantes da vida do jovem Léo em Cordeirópolis, momentos da infância e o episódio do falecimento de Dona Leila, sua companheira de toda a vida.

A série conta ainda com as participações de grandes nomes do jornalismo brasileiro, como Pedro Bial, Tadeu Schmidt, GalvãoBueno, Boni, Leilane Neubarth e Luis Roberto – responsável pelo apelido carinhoso de “a voz marcante da TV brasileira”, que falam com muito carinho e respeito do colega de profissão e relembram histórias divertidas, como o dia em que Léo Batista dormiu ao vivo, em plena transmissão dos Jogos Olímpicos de Seul.



Por Manoela Ferrari