Abril, 2022 - Edição 278

Ziraldo, o bom menino

O sistema de ensino ficou dois anos sem aulas presenciais, com educação à distância ou híbrida. No município do Rio, somamos 1.543 unidades de ensino e quase 670 mil alunos (669.504), do berçário ao ensino fundamental. A volta às aulas foi resultado de uma operação planejada desde o ano passado, com o levantamento das necessidades da rede, realização de licitações, contratações e gerenciamento para entregas de material pedagógico e uniformes.

Uma das atividades de sucesso retomada este ano foi a “Ciranda com Autores”, uma ação conjunta do Instituto Antares de Cultura com a Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, que desde 2009 movimenta as escolas municipais, injetando ânimo e incentivo às aulas de português e literatura. O vigor ao longo dos eventos anteriores reforçou a certeza de que a literatura acalenta e a escrita abre portas. A Ciranda enseja o aprofundamento sobre a vida e a obra de um autor essencial, promovendo um concurso de redação abrangente, destinado aos estudantes do 4º ao 9º ano do Ensino Fundamental e da Educação de Jovens e Adultos da Rede municipal. Com os trabalhos que surgem ao longo da Maratona, os participantes estão diante da oportunidade de repensar os próprios comportamentos, valorizando a criatividade através da leitura e da escrita, compartilhando ideias, histórias e aventuras.

Ninguém melhor do que Ziraldo, um dos maiores fenômenos editoriais no Brasil, para retomar essa jornada. O humor e a crítica estão unidos na plasticidade de suas obras. Numa dessas conjunções de fatores favoráveis, a homenagem chega no ano em que ele completa 90 anos.

Um dos escritores infantis mais conhecidos do mundo, com obras traduzidas para diversos idiomas, Ziraldo é premiado pelo seu trabalho na literatura e no humor, atua intensamente na ilustração de livros, elaboração de materiais educativos, criação de charges, caricaturas e logos, como o ícone da ecologia apresentado na Olimpíada de 2016, no Rio de Janeiro. Com quase 200 obras publicadas, não faltará material para inspirar as redações.

O reconhecimento da importância e centralidade da educação e da cultura, tanto no desenvolvimento econômico, quanto na perspectiva do desenvolvimento humano, é inquestionável.




O autor

Ziraldo Alves Pinto nasceu em Caratinga, Minas Gerais, no dia 24 de outubro de 1932. Todos têm curiosidade de saber a origem desse nome, tão diferente. A palavra surgiu da combinação dos nomes da mãe, Zizinha e o do pai Geraldo, que tiveram mais seis filhos, entre eles Zélio e Ziralzi. A prática de combinar sílabas dos nomes era comum entre as famílias de antigamente.

Desde criança, Ziraldo já mostrava talento para o desenho. Com seis anos, teve um desenho seu publicado no jornal Folha de Minas. Adulto, largou o diploma de Direito para dedicar-se ao desenho. Foi uma escolha impulsionada pelo talento incontestável.

Ziraldo estudou no Grupo Escolar Princesa Isabel. Em 1949, foi com a avó para o Rio de Janeiro, onde estudou por dois anos na MABE (Moderna Associação de Ensino). Em 1950, retornou para Caratinga e concluiu o científico no Colégio Nossa Senhora das Graças.


Carreira

A carreira de Ziraldo começou na revista Era Uma Vez, quando fazia colaborações mensais. Em 1954, começou a trabalhar no jornal Folha da Manhã (hoje Folha de S. Paulo), desenhando em uma coluna de humor.

Depois de trabalhar na Manchete Esportiva, em 1957, foi para a revista O Cruzeiro, publicação de grande prestígio na época. Nesse mesmo ano, formou-se em Direito na Universidade Federal de Minas Gerais. Em 1958, casou-se com Vilma Gontijo (ficou casado até o ano 2000), com quem teve três filhos, Daniela, Antônio e Fabrízia. Depois, casou-se com Márcia Martins da Silva.

Em outubro de 1960, lançou a primeira revista brasileira de quadrinhos e colorida, de um só autor, intitulada Pererê. As histórias da revista já vinham sendo publicadas em cartuns nas páginas da revista O Cruzeiro, desde 1959.

As histórias se passavam na floresta fictícia Mata do Fundão. A publicação da revista durou até abril de 1964, quando foi suspensa. Em 1975, a revista foi relançada com o nome de A Turma do Pererê, mas só durou um ano.

Segundo o próprio Ziraldo em sua autobiografia, o “Pererê” era um dos símbolos da época. Um tempo em que se acreditava que, pelas ideias, poderia se mudar a história.

Hoje, as histórias do Pererê fazem parte da memória nacional, tendo marcado uma fase na história deste tipo de publicações no Brasil. Já foi citado, certa vez, que Ziraldo se inspirou nas histórias do Sítio do Picapau Amarelo, de Monteiro Lobato, para criação de seus personagens. Vivendo no Rio há mais e 50 anos, Ziraldo é carioca por adoção, adora visitar a Floresta da Tijuca e ver a paisagem carioca, desde Niterói. Para ele, o melhor da cidade são os cariocas, que o autor considera como uma “entidade”: “A alma da cidade.” De hábitos simples, quando viaja, o que mais sente falta é do “arroz e feijão”. Recentemente, disse em entrevista: “A velhice é uma coisa que acontece de surpresa.”

O AVC, sofrido pelo cartunista em 2018, no Rio, pegou todos de surpresa, porque ele sempre teve boa saúde. Embora já tenha sofrido um infarto leve, em 2013, em Frankfurt, na Alemanha, continua trabalhando e produzindo.


O Menino Maluquinho

Em 1980, Ziraldo lançou O Menino Maluquinho, um dos maiores fenômenos editoriais no Brasil de todos os tempos. O menino maluquinho é uma criança que vive com uma panela na cabeça. Alegre, sapeca, cheio de imaginação, adora aprontar e viver aventuras com os amigos.

Em 1981, o livro recebeu o “Prêmio Jabuti da Câmara Brasileira do Livro”. Em 1989, começou a publicação da revista e das tirinhas em quadrinhos do personagem. A obra serviu de inspiração para adaptações no teatro, televisão, quadrinhos, videogames e cinema.

As histórias em quadrinhos foram publicadas pelas Editoras Abril e Globo, de 1989 a 2007. O livro original que inspirou a série se tornou um sucesso estrondoso, tendo vendido mais de três milhões de exemplares, descrevendo atividades que traduzem, liricamente, o sabor da infância.

Na grande obra infantil de Ziraldo, verso e desenho contam a história desse menino traquinas, sempre aprontando muita confusão. Alegria da casa, liderava a garotada, era sabido e um amigão. Fazia versinhos, canções, inventava brincadeiras. Tirava dez em todas as matérias, mas era zero em comportamento!



Criação e concepção

“Era uma vez um menino que tinha o olho maior que a barriga, fogo no rabo e vento nos pés.”
A frase abre o livro O Menino Maluquinho, que apresentou ao mundo um dos mais queridos personagens brasileiros, criado por Ziraldo no dia de seu 48º aniversário: 24 de outubro de 1980. Portanto, neste ano da Ciranda de Autores, o personagem completa 42 anos.

Ziraldo conta que a inspiração para criar o menino surgiu espontaneamente, enquanto ele fazia a barba e falava consigo mesmo olhando no espelho. Criado pelo cartunista tanto em texto quanto em imagem, Maluquinho rapidamente foi para as tiras e quadrinhos, onde ganhou turma. Destaque, inclusive, para sensível e espevitada Julieta, que ganhou até revista própria, na primeira década dos anos 2000.

Mas Ziraldo, do alto de sua modéstia, não considera O Menino Maluquinho um sucesso tão espetacular entre as crianças: “Em histórias em quadrinhos infantis, no Brasil, só o Maurício de Sousa conseguiu se firmar. Ele já faz parte do inconsciente coletivo. As crianças já conhecem Maurício, porque os pais já conheciam o Maurício”, afirmou Ziraldo em entrevista.

Por Manoela Ferrari