Julho - 2025 - Edição 307
Duayer
Quando o jornal O
Pasquim completou 10 anos de
existência, colocou nas bancas
uma edição comemorativa com
80 páginas numa edição histórica. Na página 69 – sem malícia
– estava lá, um espaço todinho
dedicado ao “Humorista especializado em panelas vazias”,
frase que define bem o que é o
trabalho do cartunista Duayer.
Naquela ocasião, o desenhista
ofereceu aos leitores 9 desenhos
carregados de crítica social,
cutucando, com a ponta do
lápis, a máxima de que “é preciso primeiro crescer o bolo,
para depois distribuí-lo”, frase
tacanha dita cinicamente por
Delfim Netto, um dos autores do tal “milagre econômico”, durante os
governos militares.
O desenhista de humor, cujo nome completo é José Arimathéa
Bastos Duayer, é também um ótimo e premiado fotógrafo, nasceu no
município de Tombos – MG, no dia 14 de maio de 1948, é formado em
jornalismo pela Universidade Federal Fluminense – UFF, iniciou sua trajetória na imprensa carioca como repórter da rádio Jornal do Brasil e, depois
de uma passagem como fotógrafo da revista Manchete, foi convidado pelo
Ziraldo para colaborar com O Pasquim.
Num momento quando apenas a fotografia satisfazia sua verve
de artista, Duayer, despretensiosamente, desenhou um cartum e depois
o jogou fora, mas o atento Henfil viu o desenho e recomendou que continuasse naquela nova atividade. Após o criador dos Fradinhos exibir o
cartum aos colegas Jaguar e Fortuna, Duayer uniu o lápis e o nanquim à
sua máquina fotográfica e passou a se dedicar também ao humor gráfico.
Daí por diante, se consagrou como um dos grandes do nosso desenho de
humor.
Mas não foi somente no hebdomadário O Pasquim que o cartunista
fez História. Desde que começou a produzir cartuns e charges, de seu início, até o final dos anos 1980, Duayer também publicou seus desenhos no
Diário de Notícias, Jornal do Brasil, Última Hora, A Crítica, Ovelha Negra
e Pingente (tabloide que ele editou em parceria com os colegas Coentro,
Guidacci, Jésus Rocha e Nani) e nas revistas Playboy, Visão, Status, Ficção,
Revista do Homem, Mad, Revista da Shell, O Guarda-Chuva, Revista do
Faustão e O Caixote.
No início dos anos 1990, Duayer estava há tempos sem produzir,
quando colegas do traço o convenceram a participar do 3º Salão Carioca
de Humor que, naquele ano, homenageava o Ziraldo. “Eu estava sem
desenhar há uns três anos e já havia doado meu material de artes todinho
(tintas, pincéis e blocos de desenho), quando o Dil Márcio me persuadiu
a remeter um desenho para o salão. Não adiantou meu argumento de que
não gostava de disputar com colegas e participar de salões. Sempre fui
contra às participações de profissionais em eventos semelhantes. Achava
que os prêmios oferecidos deveriam ser distribuídos pelos 5 primeiros
lugares ou coisa parecida. Enfim, acabei cedendo e ganhei o 1º lugar na
categoria cartum. Foi o primeiro e último salão que participei”, disse.
Numa arte “steinberguiana”, Duayer apresentou um desenho com diversos
prédios num fundo preto, com a inserção de uma clássica borracha Albion
apagando detalhes num movimento em meia lua. Possivelmente, um dos
prêmios mais justos daquela edição do saudoso salão da Laura Alvim.
O cartunista também deixou sua marca em diversos livros, entre
eles a coletânea de charges e cartuns No País das Maravilhas (Codecri
/1981), os infantis Viajante e Minha Casa (ambos pela Callis /1988 e
1999), Cartas (Ygarapé/2011), As Histórias de Meu Avô (Secretaria de
Cultura do Espírito Santo/2013) e Retratos, que exibe uma coleção de
algumas fotografias do artista, entre paisagens e retratos de personalidades e anônimos (Editora do Autor/2021). Duayer participou também
de obras coletivas como Zensur in Brasilien – Anistia Internacional
(Suécia/1976), Enciclopédia Latino-Americana de Humor (Signo,
Colômbia/1977), Brasilien, der Proteste der Politischen Gefangenen –
Anistia Internacional (Alemanha/1978), Enciclopédia Brasileira de Humor,
volume II (LP&M/1979), O Novo Humor do Pasquim (Codecri/1980), O
Pasquim – Antologia / Volumes II e III (2009 e 2011) e 90 Maluquinhos por
Ziraldo – Histórias e Causos (Melhoramentos/2023).
Além das obras literárias citadas, uma das mais significativas publicações que Duayer participou foi o livro Salve-se Quem Puder (Martins Fontes/2019), publicação que representa bem como era atuar num jornal alternativo como O Pasquim no auge da Ditadura Militar. Reunindo uma invejável coleção de fotografias e cartuns do artista, o projeto, surgiu ainda nos tempos da extinta Desiderata, quando o Jaguar propôs à editora selecionar charges e cartuns, sem textos e sem fotos, mas a empresa faliu e o projeto foi cancelado voltando para a gaveta. Nove anos depois, em 2019, o jornalista Francisco Ucha queria aproveitar o aniversário de 50 anos do famoso jornal e procurou Duayer para produzir um livro temático. Seguindo a ideia do Ucha, o livro foi finalizado com pouco mais de 190 páginas muito bem planejadas, oferecendo ao leitor uma incrível iconografia com cartuns, charges e retratos históricos de alguns dos entrevistados do tabloide e de seus próprios editores, fotos que ilustraram as matérias humorísticas do jornal e ensaios com algumas das musas do semanário, entre elas a bela Kate Lira, no auge de sua formosura. Um dossiê definitivo sobre O Pasquim e sua luta pela redemocratização do Brasil
Sobre suas origens, durante troca de mensagens, Duayer nos contou interessantes lembranças sobre seu pai que, na década de 1950, era um documentarista amador que costumava realizar filmagens com uma câmera Bell & Howell, 16mm, quando registrava festas religiosas e eventos pelo interior de Minas Gerais. Nos finais de semana, armava uma tela no poste de luz em frente à sua casa e projetava esses curtas para a população local. De certa maneira, a magia das imagens deve ter influenciado Duayer a se interessar pela arte da fotografia e, depois, pelo desenho. Nas redes sociais, o leitor do Jornal de Letras pode conferir as postagens do cartunista e fotógrafo que mantém seus perfis atualizados, no Instagram (@duayer.arte) e no Facebook (duayerduayer).
Saúde e Arte!