Março - 2021 - Edição 265
Lembranças do Mendez sobre J. Carlos
Em 1988, o Max Barbosa, desenhista de humor que iniciava sua carreira nas artes, era muito influenciado
na obra do caricaturista José Carlos de
Brito e Cunha, o J. Carlos, que consagrou-se graças ao seu traço moderno e extremamente belo. Para estudar
melhor o estilo de seu artista predileto,
Max estava em contato com os herdeiros deste grande caricaturista e sugeriu
que fizéssemos uma visita ao prédio
onde residiam os Brito e Cunha, mas
sabendo da minha amizade com o caricaturista Mário Mendez, recomendou que o
levássemos também.
Consideramos as preocupações de sua
esposa, Dona Emília, e as muitas e justas recomendações exigidas por conta da idade um pouco
avançada do Mendez, já que o artista estava com
pouco mais de 80 anos. Com zelo e nos cercando de
todos os cuidados, fomos com nosso amigo para a
Rua J. Carlos, no Jardim Botânico.
O encontro foi um dos mais interessantes que participei e, é claro, registrei com algumas fotografias esse dia especial. Fomos recebidos por Eduardo Augusto, Luiz Carlos, Lucia e
Lourdes, filhos de J.Carlos, infelizmente todos
já falecidos. A alegria do Mendez em rever os
filhos de seu amigo e colega, além de poder
recordar alguns fatos divertidos sobre ambos,
era flagrante.
Mendez aproveitou para lembrar como conheceu J. Carlos, e contou-nos
que, quando era colaborador do jornal A Batalha, costumava almoçar numa
pensão cuja proprietária chamava-se Laura, e era amiga de Dona Emília, com
quem o caricaturista já namorava na época. Num dia, enquanto almoçava,
começou a esboçar a caricatura de um sujeito que estava sentado próximo. O
homem não percebeu, mas Dona Laura viu e comentou: “O senhor desenha
caricaturas! Sabia que tenho um freguês que é seu colega?” Mendez, achando
que ela fosse falar sobre um amador que gostava de rabiscar, perguntou, com
ares de quem já era profissional: “Quem é o tal caricaturista?” “Ah, é o J. Carlos”,
respondeu Dona Laura. Ao ouvir o nome do famoso desenhista, Mendez corou
de espanto. Ele não imaginava que frequentava o mesmo local que o fabuloso
mestre, de quem guardava grande admiração desde os tempos de adolescente.
Num outro dia, quando J. Carlos chegou para almoçar, Dona Laura fez as apresentações e os dois passaram a conversar animadamente. Numa demonstração
de humildade que Mendez nunca mais esqueceria, J. Carlos afirmou que já
conhecia o trabalho do novo amigo, e que havia gostado especialmente de uma
caricatura de um cômico espanhol que atendia pelo pseudônimo de Palitos.
Entre muitas histórias e recordações, Mendez e os filhos do caricaturista lembraram de outros tantos fatos, inclusive que o prédio onde os filhos moravam e nos receberam foi construído na propriedade adquirida por J. Carlos. Contaram que, naquele terreno, onde foi construída sua residência, o artista havia enterrado um lápis, sua mais importante ferramenta de trabalho, simbolicamente como se fosse uma semente, e que ali garantiria o futuro e a moradia de sua família. De fato, anos mais tarde, após a morte de J. Carlos, no local foi construído o edifício onde seus filhos moraram por muitos anos.
A Rua J. Carlos
Falecido em 1950, J. Carlos passou a ser nome de rua justamente na localidade onde construiu sua residência. Em junho de 1951, a antiga Rua Sucupira, no Jardim Botânico, foi rebatizada com o nome do grande mestre da caricatura carioca. Mário Mendez esteve presente nesta data histórica junto com pessoas da família do homenageado e ilustres intelectuais da época, entre os quais o historiador Herman Lima, os escritores Olegário Mariano e Alvaro Moreyra, o artista plástico Leopoldo Gatuzzo e seus colegas caricaturistas Álvaro Cotrim (Álvarus), K. Lixto, Raul Pederneiras e Théo, além dos representantes da prefeitura da cidade, quando da inauguração da placa com o nome de J. Carlos.
Saúde e Arte!