Novembro, 2025 - Edição 309

Lições para o Século 21

A inteligência artificial (IA) é um dos temas mais discutidos na atualidade e desperta tanto entusiasmo quanto preocupação. O historiador israelense Yuval Noah Harari, autor de obras como Sapiens, Homo Deus e, mais recentemente, 21 Lições para o Século 21 (Companhia das Letras), é uma das vozes mais influentes nesse debate. Para ele, a IA não é apenas uma ferramenta tecnológica, mas um poder capaz de transformar profundamente a política, a economia, a cultura e até mesmo a maneira como os seres humanos entendem a si próprios. Ao analisar o futuro da humanidade, o pensador alerta para os riscos da concentração de poder, da perda de empregos e do enfraquecimento da democracia diante dessa tecnologia revolucionária.

Revolução

Harari destaca que a IA deve ser vista como a maior revolução da história humana, pois não apenas amplia a força física, como ocorreu com as máquinas na Revolução Industrial, mas invade o campo da própria inteligência, antes considerada exclusiva do ser humano. Essa característica faz da IA um divisor de águas, capaz de gerar avanços extraordinários, mas também de criar desequilíbrios de poder. Para o autor, quem dominar os dados e os algoritmos terá o controle do mundo, o que pode aumentar ainda mais a desigualdade entre países e empresas.

Outro ponto fundamental em sua visão é o impacto da IA sobre o trabalho e a economia. Harari argumenta que não apenas tarefas manuais, mas também funções intelectuais poderão ser substituídas por máquinas mais rápidas e eficientes. Motoristas, advogados, médicos e até professores podem ver suas atividades ameaçadas. Isso gera a possibilidade do surgimento de uma “classe inútil”, formada por pessoas que não conseguirão competir com a tecnologia e que, portanto, ficariam marginalizadas. Além da questão econômica, o autor ressalta a dimensão psicológica desse problema, pois o trabalho dá sentido à vida e, sem ele, milhões de indivíduos podem enfrentar crises de identidade.

Além da economia, o historiador alerta para o risco que a IA representa à liberdade individual e à democracia. Segundo ele, algoritmos são capazes de conhecer desejos e emoções humanas com mais precisão do que nós mesmos. Com base nesses dados, podem influenciar comportamentos, orientar escolhas de consumo e até manipular opiniões políticas. A propaganda do futuro não será feita de forma genérica, mas por mensagens personalizadas, invisíveis e eficazes. Nesse cenário, regimes autoritários podemusar a IA para vigiar e controlar a população em um nível jamais visto, minando a ideia de livre-arbítrio e ameaçando as democracias liberais. Em paralelo, Harari também reconhece os benefícios da IA.

Entre eles, avanços médicos, maior eficiência na produção de bens e serviços e até soluções para problemas ambientais. Entretanto, e ressalta que tais benefícios só serão alcançados se a tecnologia for regulada de maneira ética e responsável. Para o autor, a questão central não é o que a IA pode fazer, mas sim o que a humanidade escolherá fazer com ela. É preciso definir limites, criar leis e estabelecer valores claros para que a tecnologia seja uma aliada da humanidade, e não uma ameaça.

Entre a esperança e o alerta

Vivemos um século de incertezas e possibilidades. A tecnologia avança a passos largos, trazendo tanto promessas quanto desafios imensos. A política se redefine a cada dia, a educação precisa se reinventar e o conceito de verdade está mais frágil do que nunca. As proposições do livro 21 Lições para o Século 21 não nos oferecem respostas simples, mas perguntas poderosas que nos fazem refletir sobre o que estamos fazendo com o presente e o futuro.

Em síntese, a visão de Yuval Harari sobre a IA é marcada por um equilíbrio entre esperança e alerta. Ele reconhece o potencial dessa tecnologia para melhorar a vida das pessoas, mas enfatiza os riscos da concentração de poder, da exclusão econômica e da manipulação política.

A cada decisão, a cada interação, estamos moldando o amanhã. E, talvez, o maior desafio de todos seja o de manter a nossa humanidade frente às mudanças que nos rodeiam. Precisamos estar atentos, não só ao que acontece ao nosso redor, mas também ao que acontece dentro de nós.

O livro de Harari não é um fim, mas um início de reflexão. Ele nos convida a questionar, a aprender, a adaptar, a evoluir. E acima de tudo, a não perder de vista o que realmente nos faz humanos – nossa capacidade de empatia, de criatividade, de pensar e agir de maneira ética.

A IA não deve ser encarada como algo neutro, mas como um desafio ético e político do nosso tempo. O futuro, portanto, dependerá menos das máquinas em si e mais das escolhas que a humanidade fizer em relação ao seu uso. Cabe a nós decidir se a IA será instrumento de progresso ou de desigualdade. O futuro, portanto, depende de nós.

Por Manoela Ferrari