Maio, 2025 - Edição 306

Sanguinetti toma posse na ABL

Aos 89 anos, o ex-presidente uruguaio (por dois mandatos) Júlio Maria Sanguinetti tomou posse na cadeira nº 8 da Academia Brasileira de Letras (ABL) como sócio correspondente. O patrono da cadeira é Sebastião da Rocha Pitta, autor de uma importante história, da América Portuguesa no começo do século XVIII. O presidente da ABL, Merval Pereira, ressaltou a importância e a feliz coincidência do momento da posse de Sanguinetti – maior responsável pela democratização do Uruguai – justamente quando o Brasil comemora 40 anos da redemocratização.

Em seu discurso de posse, na presença do decano da ABL, o ex-presidente Jose Sarney, do cônsul do Uruguai, Alexandre Mongrel e de seu filho Julio Luiz, Sanguinetti falou da história de Uruguai e Brasil: “Uma história de disputas de territórios entre os impérios, que no decorrer dos anos se tornou de fraternidade, paz e confraternização.” Lembrou também de dois brasileiros importantes para a história do Uruguai: o Barão do Rio Branco, responsável por definir as fronteiras dos dois países, e o Barão de Mauá: “O Barão de Rio Branco é uma figura muito importante na nossa história. Pensem vocês que, quando morreu Rio Branco, Uruguai decretou luto nacional. De honras de ministro do Estado. O Barão de Mauá foi o intermediador de contratos nos empréstimos financeiros realizados pelo governo do Brasil ao governo do Uruguai, em 1850. É uma figura fundamental na economia do Brasil, da Argentina, do Uruguai, do Paraguai.”

Sanguinetti recordou sua amizade com José Sarney e falou dos momentos dramáticos até que ele assumisse a presidência do Brasil, após a morte de Tancredo Neves. O ex-presidente saudou o amigo e, agora, sócio correspondente, falando da emoção de ocupar, mais uma vez, a tribuna da Casa de Machado: “Eu também comemoro uma data que talvez tenha sido a alegria mais pura da minha vida. Foi o dia que entrei para a Academia Brasileira de Letras. Isso em 1980. Portanto, completo 45 anos de acadêmico, sendo o decano dessa casa, que me traz uma grande alegria, mas também uma grande preocupação.

Porque o decano significa que aqueles que já votaram nele já morreram. Então chegou a sua vez. Espero que o Criador não tenha nenhuma pressa.” Para finalizar, Sarney ressaltou as qualidades intelectuais de Sanguinetti: “Sanguinetti é homem da fronteira, divide conosco a banda oriental do rio Uruguai, que nos separa da Argentina e atravessa com facilidade as cochilas e pradarias que nos unem. Naturalmente, o ensaísta político avulta na obra literária de Sanguinetti. Nela se confundem o jornalista, o escritor e o político, o homem de honra, que se bateu até num duelo para defender um amigo.

Desde cedo, ele examinou as questões que nos fizeram ter intermitentes e devidas intromissões militares na política em toda a América Latina, especialmente no Cone Sul. Defendeu a democracia com coragem e moderação, em que se insere sua progressiva e fundamental participação no Partido Colorado, sua ordinária construção, que em breve fará 200 anos e que será, sem dúvida, um dos maiores partidos, organizações partidárias do mundo.

Sanguinetti é um conservador precioso, e aí esta palavra representa mais em espanhol do que na nossa língua. Em que a memória aflui em narrativa preciosa pela simultânea visão do conjunto e das circunstâncias e pelo mergulho pinçado com precisão científica nos detalhes que definem os personagens e os acontecimentos. E do lugar que ele destinou à história, ele teve a oportunidade, como poucos, de observar de perto a uns e outros. Seus retratos é um livro que ele escreveu, desde La Memoria, é uma obra essencial para conhecer a transição, os séculos e a transição para a democracia. Transição de que, insisto, ele é protagonista e até herói e construtor. Júlio Maria é também um crítico fundamental para as artes plásticas do Uruguai, tendo construído desde cedo uma coleção de arte de importância excepcional. Sua crítica foi, de certo modo, participante na definição dos caminhos que as artes plásticas seguiram ao longo dos últimos 70 anos no seu país.”