Setembro, 2024 - Edição 302

A História da Cirurgia de Catarata (ABL)

O cristalino é uma lente transparente e flexível, que se localiza atrás da pupila e que tem a função de regular o foco dos objetos. Catarata é o nome que se dá à opacificação do cristalino, que reduz a entrada de luz nos olhos e causa diminuição da acuidade visual. O termo vem do grego Katarakte, que significa “coisa que cai”, porque, na Antiguidade, pensava-se que a piora da visão que ocorre quando o cristalino se opacifica era causada por uma espécie de véu que cobria lentamente a visão, imitando o curso de uma catarata. O registro mais antigo que se conhece sobre a catarata encontra-se em uma escultura existente no Museu do Cairo, datada do século XXVI a.C., que mostra uma opacificação monocular do cristalino.

Na maioria dos casos, a catarata progride gradualmente, por vários anos. A progressão pode variar de um olho para outro na mesma pessoa. Em pessoas mais jovens e nos pacientes diabéticos, a evolução pode ser mais rápida, levando a uma diminuição importante da visão em poucos meses.

A catarata, que pode ser congênita, tem múltiplas causas:
• Medicamentos (corticoides)
• Substâncias tóxicas (nicotina)
• Doenças metabólicas (diabetes)
• Trauma
• Radiações
• Cirurgia intraocular prévia
O tratamento é cirúrgico e consiste em substituir o cristalino opacificado por uma lente intraocular transparente (cristalino artificial).

O primeiro método cirúrgico começou a ser realizado por volta de 600 a. C. e está descrito pelo médico indiano Sushruta em seu tratado sobre cirurgia, onde detalha a técnica de reclinação. Nessa técnica, o cristalino é deslocado para a câmara posterior do olho com um estilete, da maneira a deixar a área pupilar livre.

A primeira extração da catarata foi feita pelo médico francês Jacques Daviel, em 1745. Na verdade, o plano inicial era fazer uma reclinação, mas, como o paciente teve uma intensa hemorragia per-operatória, Daviel optou por fazer uma incisão e retirar o cristalino opacificado. A partir daí, a retirada do cristalino passou a ser a técnica utilizada, mas ainda não eram implantadas lentes intraoculares.

A história moderna dos implantes intraoculares começou em 1949, com Harold Ridley, oftalmologista inglês, que se inspirou em um comentário feito por um estudante de medicina que lhe chamou a atenção por haver “esquecido” de substituir o cristalino opacificado por um “novo”, enquanto o observava suturar a incisão durante uma cirurgia de catarata.

Durante a Segunda Guerra Mundial, Ridley teve a oportunidade de observar que alguns pilotos dos caças ingleses (spitfires) que eram bombardeados apresentavam fragmentos do material plástico das cabines dos aviões dentro dos olhos, e que esse material (polimetilmetacrilato) não despertava nenhum tipo de reação por parte dos tecidos oculares. Ocorreu a Ridley que o polimetimetacrilato poderia ser utilizado para substituir o cristalino humano. Em 29 de novembro de 1949, em Londres, ele implantou sua primeira lente intraocular.

Quando os primeiros resultados dessa técnica foram divulgados, em 1951, houve uma explosão de entusiasmo que levou grandes nomes da oftalmologia europeia a seguir o exemplo de Ridley. Nas décadas seguintes, testemunhamos uma evolução vertiginosa no que se refere aos modelos e à qualidade visual das lentes intraoculares.

A escolha do implante deve ser feita de comum acordo entre o paciente e o oftalmologista, e deve levar em conta o perfil e as necessidades de cada pessoa em particular. A cirurgia da catarata é, nos dias atuais, uma das mais realizadas em todo o mundo e é capaz de melhorar muito a qualidade de vida dos pacientes, principalmente se levarmos em conta que cerca de oitenta por cento da relação de um ser humano com o mundo exterior ocorre através da visão.

Por Almir Guiaroni, escritor. Livros publicados: Elos Invisíveis, As Cores da Vida, Uma Vida Não Basta. Vencedor do Prêmio Varilux por três vezes.