Fevereiro, 2023 - Edição 288
O livro de Olavo Bilac que retorna ao leitor
Cento e vinte e oito anos depois da primeira e única edição completa, retorna
ao leitor o belíssimo livro de Olavo Bilac (1856-1918), intitulado Crônicas e Novelas e
publicado pela Editora Liberdade, de Ouro Preto.
Essa obra em prosa foi escrita quando da passagem de Bilac por Ouro Preto em
1893 e publicada em 1894.
Em 1893, fugindo da perseguição do presidente Floriano Peixoto, juntamente
com outros intelectuais cariocas também vítimas do Marechal de Ferro, Olavo Bilac
buscou refúgio nas montanhas de Minas e viveu alguns meses em Ouro Preto e, depois,
em Juiz de Fora.
A amizade com o escritor e jurista Afonso Arinos de Melo Franco, que atuava
como advogado e professor do Liceu Mineiro na antiga capital de Minas, deu a Bilac
o passaporte para conhecer a cidade de Ouro Preto, sua história, os arquivos e monumentos, igrejas e natureza. Bilac ficou encantado e, aos poucos, convencido de que as
raízes do Brasil estavam em Minas – mais especificamente, na Vila Rica do passado que
se fundia, a seus olhos, na Ouro Preto quase à época da mudança da capital. Conversou
muito, teve estreito contato com o historiador Diogo de Vasconcelos em cuja casa se
hospedou antes de se transferir para o Hotel Martinelli, na Rua do Paraná, com o outro
historiador e jornalista José Pedro Xavier da Veiga, que então elaborava a proposta de
fundação do Arquivo Público Mineiro e da respectiva Revista, com artistas e jornalistas
da cidade, além de intelectuais cariocas que estavam refugiados em Ouro Preto.
Afonso Arinos os recebia em sua residência, na Rua do Paraná, em encontros
que certamente contribuíram para a imersão de Bilac na história das Minas. Discutiase a mudança da capital; Bilac foi conhecer o Curral del Rei, que sediaria o novo
projeto, símbolo moderno de cidade traçada, em contraste com Vila Rica/Ouro Preto.
Planejava-se a instalação do monumento a Tiradentes; criara-se em 1892 a Escola Livre
de Direito de Ouro Preto. De maneira geral, as opiniões se acentuavam entre mudancistas e antimudancistas, e esse debate estava instalado na imprensa ouro-pretana. Em
meio às discussões sobre mecanismos de modernização da cidade, tentativa extrema
de manter a capital em Ouro Preto cheia de largas avenidas, boulevards e passeios
públicos da moda, Bilac se divide: ama Vila Rica/Ouro Preto e parece, por isso, tender a
que a capital se mudasse mesmo. Estava, pois, divido entre um locus que pedia proteção, preservação e cuidado, e uma ideia urbana nova, palpitante, grandiosa e moderna.
Olavo Bilac percorreu Ouro Preto, conduzido por Afonso Arinos, que prezava
as tradições mineiras, numa linha que o afiliava ao poeta e romancista ouro-pretano
Bernardo Guimarães (1829-1884). Visitou as capelas primitivas, as mais antigas, São
João, Santana, Padre Faria, caminhou pelo Morro da Queimada, pelas Lajes. Falou de
Marília, de Dirceu, de Aleijadinho, dos Inconfidentes, dos pobres que trabalharam
nas minas, dos morféticos, da contradição entre riqueza extrema e extrema miséria.
Exultou as belezas, reparou minúcias, criticou poderosos soberbos, festas de triunfo da
riqueza e da opressão.
Esses temas são tratados em Crônicas e Novelas. É bom ler, reler e de novo
voltar a eles, na prosa muito fina, bem urdida, rica e poderosa de Olavo Bilac. Uma
bela planta da cidade de Ouro Preto, de 1881, vem encartada ao livro, em cor original
e traços muito firmes, como uma sinalização dos lugares que, em 1893, ele percorreu
e admirou. A edição é enriquecida pelo posfácio do pesquisador e professor Antônio
Dimas (USP), profundo conhecedor da obra de Bilac.
Crônicas e Novelas é uma das publicações com que a Editora Liberdade comemora o Bicentenário da Imprensa Mineira/ Ouro-Pretana (1823- 2023).