Setembro, 2022 - Edição 283
Entrevista com Alexandre Valle
Entrevista transmitida em nível nacional, no Programa Identidade Brasil, apresentado por Arnaldo Niskier no canal Futura

UniverSeeduc – Qualificando profissionais da Educação
Arnaldo Niskier: Hoje, temos o prazer de receber a visita do Secretário de Estado
de Educação do Rio de Janeiro, o professor
Alexandre Valle. Ele tem experiência vasta no
assunto, na vida pública, já foi diretor de Pesos
e Medidas do Rio de Janeiro e vai nos contar um
pouco sobre isso também. Gostaria de fazer a
primeira pergunta sobre o que é recuperação
fiscal. Fala-se tanto nisso. O que é recuperação
fiscal?
Alexandre Valle: O Estado do Rio de Janeiro
passou por um problema grave, nos últimos anos,
com salários atrasados, fornecedores que não
eram pagos e o Estado passou por um processo
em que foi ao governo federal para que fizesse
o regime de recuperação. Algumas imposições
foram colocadas ao Estado e fizeram com que,
através de uma gestão comprometida com o
Estado, pudesse se organizar as contas do Estado.
E hoje temos a grande alegria do servidor poder
receber seu salário em dia, honrar seus compromissos financeiros. É claro que esse processo
todo do regime também acarreta compromissos e
responsabilidades e, consequentemente, o Estado
tem que cumprir suas obrigações para que permaneça no regime. Temos uma dívida alta para
pagar, mas precisamos também adequar as contas do Estado, para que possamos nos beneficiar
desse regime que o governo federal aceitou.
Arnaldo Niskier: Há previsão de um tempo
para pagar essas dívidas?
Alexandre Valle: Há uma previsão, não sei
lhe informar agora quantos anos são, mas há uma
previsão e o governo tem que ir pagando essa
dívida anualmente. São alguns bilhões de reais
que contraímos de dívida, por isso precisa ter a
responsabilidade com o recurso público para que
o servidor, para que os investimentos no Estado,
para que o Estado do Rio de Janeiro efetivamente
possa voltar a crescer como o que temos assistido
hoje.
Arnaldo Niskier: Existe a possibilidade de
se pagar melhor ao professor, porque ouço reclamações de que os professores estão recebendo
menos do que o razoável. Existe a possibilidade
de melhorar isso?
Alexandre Valle: Essa é uma das condições,
o gasto com o pessoal que o Estado fica tolhido
de fazer. O governo do Estado tem a preocupação não só com a infraestrutura da nossa rede,
mas com o nosso servidor, e muito tem sido feito
para o servidor público da educação, além dos
outros servidores, mas falo aqui pelo da educação.
Processos que ficaram anos parados na Secretaria,
como progressões, atualização do valor do vale-
-transporte e do vale-alimentação. No ano passado, tivemos o abono do Fundeb, tivemos duas
cotas do auxílio tecnológico, mas precisamos ter
responsabilidade. O regime não permite que o
Estado tenha um aumento com gasto de pessoal.
Na educação, acontece um fato até engraçado,
porque temos índice constitucional para bater e,
à medida que a arrecadação aumenta, temos que
aumentar o investimento. Certamente, quando
você faz novas escolas, tem que ter novos profissionais e isso eleva o gasto com o pessoal, então
ficamos submetidos ao regime de recuperação,
que não permite essas novas contratações. Nesse
momento, tiramos do papel um concurso de
2013/2014 e o regime nos autorizou a chamar 600
profissionais. Deveríamos chamar mais profissionais. Estamos trabalhando agora junto ao regime, para que autorize o chamamento de novos
profissionais, mas esse é um investimento com
pessoal e o Estado fica nesse questionamento
com gasto com pessoal, que é uma grande preocupação, porque você não faz uma conta só desse
momento, você faz uma conta ao longo dos anos.
Quando você coloca um funcionário para dentro
do serviço público, você vai ter uma conta a pagar
ao longo de 20, 30, 40 anos.
Arnaldo Niskier:Você fala em profissional
da educação, diria professores. Quantos professores abriga sua Secretaria de Estado?
Alexandre Valle: Nossa rede tem 60 mil funcionários hoje. Não falo só de professores. Temos
inspetores, orientadores, merendeiras, enfim, é
uma rede complexa, a maior rede do Estado a
nível de servidores. Temos todo carinho, toda
preocupação e todo compromisso, porque são
esses servidores que fazem a transformação efetiva dos nossos alunos, para que tenhamos a condição de dar o melhor ensino, dar melhor qualidade
de vida a esses alunos que tanto esperam do serviço público.
Arnaldo Niskier: Outro dia lhe fiz uma
visita e você estava criando uma universidade
corporativa dentro da Secretaria. Qual o objetivo
disso?
Alexandre Valle: A UniverSeeduc é uma
universidade corporativa que vai permitir a capacitação permanente de toda nossa rede. Esse processo estava há muitos anos no papel, tiramos do
papel e vamos dar qualificação aos nossos profissionais de educação por período contínuo. Então
é de suma importância para nós, foram parcerias com instituições muito importantes, como a
UERJ, UFRJ, SENAI e diversas outras instituições.
Arnaldo Niskier: A UniCarioca entrou
nisso e cedeu muitas bolsas?
Alexandre Valle: Sim, cedeu aproximadamente 10 mil bolsas. Então essa é a importância
da criação da UniverSeeduc, onde nosso servidor,
nosso professor estará ali sendo capacitado e preparado cada vez mais.
Arnaldo Niskier: Existe a possibilidade,
nesse ano eleitoral, de contratar mais professores para o sistema?
Alexandre Valle: A Secretaria tem autorizado a contratação, através de GLP, que é uma
gratificação, de 16 mil profissionais e mais contratos temporários, nesse período, para suprir
essa carência. Para se ter noção, na Secretaria
de Educação, hoje, se aposenta, em média, por
ano, 3 mil profissionais e há uma necessidade de
suprir essa carência. Existe hoje a necessidade
e estamos tentando junto com o regime, junto
com a Procuradoria, vencer essa questão do gasto
com o pessoal, para que possamos suprir essa
necessidade. Já temos autorizado os contratos
temporários e a gratificação, a GLP, para que possamos, dentro da própria rede, trazer esse profissional para suprir essa carência, quando ele tem o
tempo vago.
Arnaldo Niskier: Então não há risco de faltar professor e ter aluno sem aula?
Alexandre Valle: Temos feito todo esforço
possível para que isso não ocorra. Temos as carências também que são provisórias. Por exemplo:
em uma rede desse tamanho, tenho professores
que saem de licença médica, licença-maternidade e diversos outros tipos de licença, então é uma
rotina diária e ficamos sempre buscando um contrato ou a GLP para cobrir essa carência. Estamos
fazendo todo o possível para que isso não ocorra
na rede. É claro que o mais importante será um
novo concurso que não ocorre desde 2013/2014.
Arnaldo Niskier: Prestei muita atenção no
seu discurso no dia da inauguração do que seria
sua universidade corporativa e você falou muito
em qualidade do ensino. Como assegurar essa
qualidade indispensável?
Alexandre Valle: O que é importante dizermos: a educação passou por um problema, no
mundo, não foi só no Rio de Janeiro, que foi a
pandemia. Tivemos praticamente dois anos terríveis para a educação e uma perda muito grande.
O que precisamos garantir é a qualidade do ensino. Hoje precisamos garantir que esse aluno na
ponta, que é o nosso cliente (tudo isso que fazemos é para que ele seja beneficiado, não só com
o resultado que ele tenha), possa sair da escola,
ingressar numa universidade pública, poder se
formar e construir sua vida. Para isso, temos que
capacitar cada vez mais a nossa rede, para que
esses alunos tenham ensino de qualidade.
Arnaldo Niskier: Quantos alunos são?
Alexandre Valle: Hoje temos aproximadamente 730 mil alunos, temos 1.232 escolas,
temos escolas interculturais, escolas cívico-militares, escolas vocacionadas à música, ao esporte.
Estamos agora num projeto, que inauguramos
semana passada, em Caxias, que é a primeira
escola Etec, escola de novas tecnologias e oportunidades.
Arnaldo Niskier: Quais são essas novas
tecnologias?
Alexandre Valle: Essas novas tecnologias
estão sendo embarcadas em 50 Cieps. Temos
energia solar e aproveitamento de água, robótica,
gameficação, óculos de realidade virtual. As telas
são com lousa digital, tanto o professor quanto o
aluno, se tiverem necessidade de escrever, escreve e apaga com a caneta ou com a própria mão. O
professor tem a possibilidade de colocar o pen-
-drive e fazer sua aula, já vai direto para a tela,
tecnologia de ponta. Por exemplo, numa aula de
geografia, o professor na tela já puxa aquele país,
aquele local, já diz como está fazendo e o aluno
tem a possibilidade de ver aquilo ali na sua frente
on-line.
Arnaldo Niskier: E isso é em todas as escolas ou só em algumas?
Alexandre Valle: Esse é um projeto modelo
que está sendo implantado em 50 Cieps espalhados não só pela capital, mas pelo interior e pela
baixada fluminense. A opção foi pedagógica e
toda nossa parte técnica escolheu, são escolas de
horário integral que, além de toda tecnologia, tem
arte, música, horta, o projeto lixo zero, sustentabilidade, tem sala de jogos...
Arnaldo Niskier: Essas escolas têm basicamente bibliotecas e laboratórios?
Alexandre Valle: Bibliotecas, laboratórios,
chromebooks. Na semana passada, fomos inaugurar a primeira e todos que lá estiveram disseram que estavam com vontade de voltar para a
escola, porque realmente é algo encantador. Cada
vez mais, fazemos e percebemos que o aluno olha
para a escola e vê que aquilo pertence a ele. É
esse sentimento de pertencimento que viemos
lutando e conquistando dia a dia, para que aquele
aluno, que muitas vezes não tem oportunidade
em casa, que entre numa escola daquela... Posso
lhe garantir hoje, com toda certeza, que a grande
maioria das escolas privadas não tem esses equipamentos tecnológicos que colocamos na nossa
rede pública. São impressoras 3D, canetas 3D,
então é dar oportunidade a esses alunos numa
tecnologia a que poucos têm acesso hoje.
Arnaldo Niskier: O que aconteceu com os
Cieps que se deterioraram?
Alexandre Valle: Temos aproximadamente
500 Cieps. De posse do Estado, há 240, porque o
restante foi municipalizado. A nossa gestão (tanto
do governo quanto a minha, na Secretaria) tem
empenhado o papel de recuperar todas as unidades nossas. Temos a previsão de recuperar não só
os Cieps, mas as escolas regulares. Nesse projeto,
os 50 já estão sendo todos retrofitados, o conceito
da tecnologia e o conceito da estrutura no sentido
de manutenção. O Ciep tem muito problema de
infiltração, tudo isso está sendo revisto, então a
Secretaria vem fazendo um investimento muito
grande na parte de infraestrutura. Hoje tenho
mais de 107 escolas, junto com a Emop, e estamos
iniciando obras de recuperação de telhados, mas
tem sido grande parceira da Secretaria. O que me
alegra muito é saber que o governo como um todo
trabalha de forma unida, as Secretarias estão integradas, uma auxilia e ajuda a outra, isso é muito
importante.
Arnaldo Niskier: Qual é a que está mais
ligada à educação? É Ciência e Tecnologia?
Alexandre Valle: A Ciência e Tecnologia e
a Seduc, Secretaria de Educação, compõem o
orçamento da educação, mas ela cuida da parte
profissional através da Faetec, do ensino profissionalizante e das universidades que estão ligadas
a ela. E temos a rede de ensino fundamental II e a
rede de ensino médio ligada à Seduc.
Arnaldo Niskier: O que é essa tal escola
cívico-militar. O que é isso?
Alexandre Valle: Tenho muito orgulho hoje
de ter não só ampliado esse projeto, porque temos
dois grandes projetos dentro da Secretaria, três,
porque as escolas vocacionadas também fazem
parte disso. Temos as escolas interculturais, que
são parcerias com as embaixadas, e as escolas
cívico-militares em que há todo um trabalho voltado para a cidadania, para organização militar
no sentido de formar, como se fosse antigamente
o nosso Colégio Militar, sendo que os professores
são cívicos e temos os profissionais cedidos pela
Polícia Militar e duas escolas pelo Bombeiro e eles
dão toda essa orientação de cidadania aos nossos
alunos. Ontem participei de um evento em Areal
onde a nossa escola cívico-militar é um sucesso.
Essas escolas têm a menor infrequência da rede,
então isso é um ganho, tanto ela quanto nossas
escolas interculturais, porque mostram que efetivamente o aluno sente a questão do pertencimento naquela escola.
Arnaldo Niskier: Durante algum tempo,
você foi diretor do Instituto de Pesos e Medidas,
que é um órgão muito importante na estrutura
do Estado do Rio de Janeiro. Como foi essa experiência?
Alexandre Valle: Uma experiência muito
importante, porque o IPEM (Instituto de Pesos e
Medidas) é um órgão delegado do Inmetro e poucas pessoas conhecem a importância dele. É um
órgão que garante ao consumidor que ele não seja
lesado, ao exemplo, quando você coloca combustível no seu carro é ele que fiscaliza para saber se
aquela quantidade de líquido que está marcando
ali é o que está entrando efetivamente no tanque
de gasolina. É aquele que vai avaliar, quando você
vai comprar um determinado produto, se dentro
daquela embalagem é o que está sendo referido
ali na etiqueta. É aquele que vai garantir quando
você vai a uma loja de material de construção e
compra dois metros de areia, que você está recebendo na sua casa dois metros de areia. É um instituto de suma importância, altamente respeitado
que faz o trabalho também nos taxímetros dessa
classe tão maravilhosa que temos aí que são os
taxistas, que faz a correção do relógio, que faz a
verificação do taxímetro. Então é um órgão muito
importante e, muitas vezes, a própria população
não tem o conhecimento de sua importância. No
período que passei lá como presidente, fizemos
grandes ações, fizemos um trabalho belíssimo,
tenho muito orgulho de ter tido essa oportunidade de vivenciar essa experiência.
Arnaldo Niskier: E recursos para fazer
tudo que você projeta em matéria de educação.
Existem esses recursos?
Alexandre Valle: Hoje precisamos ter a
capacidade efetiva de executar os investimentos.
É o que temos feito, investindo na infraestrutura,
no nosso aluno, nos nossos servidores, demos um
abono Fundeb. Costumo dizer que o dezembro de
2021 nunca mais será esquecido pela rede de educação como um todo, foi um ano muito importante, pudemos atender nossos servidores da melhor
forma possível...
Arnaldo Niskier: O governo federal tem
ajudado o Rio de Janeiro.
Alexandre Valle: É o dinheiro que volta,
é o repasse que o Estado recebe, aí não é só
o Rio, todos os Estados receberam. Mas houve
um aumento na arrecadação referente ao ano
passado de suma importância, mas o governo
do Estado repassa e aí há um fato importante: o
governo está fazendo um TAC com o Ministério
Público, com o Tribunal de Contas, em que todo
recurso que não foi investido, no período da pandemia e períodos anteriores em que governadores
anteriores não investiram, não atingiram o índice
da educação, nos próximos 20 anos, será investido
na educação. Essa foi uma atitude do governo do
Estado, mostrando a sua responsabilidade com a
educação, garantindo à educação a efetiva utilização do dinheiro que pertence à educação. Então
esse dinheiro que não foi gasto no período da
pandemia e nos anos anteriores que não se atingiu o índice constitucional, há o compromisso do
governo do Estado em garantir esses recursos na
educação. Isso é de suma importância, acho que o
Rio de Janeiro está dando um exemplo aos demais
Estados. Nós, como gestores públicos a frente
da Secretaria, ficamos muito agradecidos com o
governo como Estado, com o governador que tem
se empenhado nessa posição de olhar para a educação como meta de política pública de Estado e
não apenas uma política pública de governo.
Arnaldo Niskier: E com isso será possível
construir novas escolas?
Alexandre Valle: Temos um déficit na cidade do Rio, no diurno, mas o governo vem investindo, por exemplo, retomamos a obra em uma
escola que estava há 13 anos parada, na Cidade
de Deus. Também retomamos as obras em uma
escola que estava há mais de 10 anos parada, em
Rio das Ostras. Estamos fazendo obras em Pedra
de Guaratiba, desapropriamos algumas escolas
fechadas, para que possamos diminuir cada vez
mais esse déficit de aluno em sala de aula. Então
o investimento não parou em educação. Estamos
investindo, construindo, desapropriando, porque
o Estado não compra, desapropria, o nome que se
dá nessa operação de compra e venda, para que
possamos aumentar nossa rede, aumentar nossos
alunos, atender cada vez mais esse aluno que, por
alguma razão ou outra, não tenha oportunidade
de estar em sala de aula.
Arnaldo Niskier: Certamente você conhece
as escolas e pergunto: existe uma escola modelo? Aquela que possamos dizer “Olha, presta
atenção nessa escola, é o modelo de tudo que
estamos fazendo”.
Alexandre Valle: A rede pública do Estado
não tem uma escola, tem várias escolas modelo.
Temos muito orgulho disso. O Estado do Rio de
Janeiro tem dado muito exemplo e, muitas vezes,
vejo pessoas criticarem a escola pública, porque certamente não conhecem a escola pública.
Temos resultados brilhantes na nossa rede, temos
parcerias brilhantes, temos profissionais que têm
dado exemplo, temos alunos que ganham campeonatos, olimpíadas de matemática, olimpíadas
de xadrez, a rede é dinâmica, grande. Posso aqui
citar a escola Erich em Santa Cruz, é uma escola onde há telhado verde, banda, xadrez, horta,
áudio, laboratório...
Arnaldo Niskier: Você não acha que isso
tudo depende muito do diretor da escola?
Alexandre Valle: Não tenha dúvida, mas por
isso estamos fazendo a capacitação dos diretores,
porque esses diretores normalmente que são professores e, quando assumem a direção, são alçados ao cargo de ordenador e passam a ser gestores. Posso garantir que mais de 95% da nossa rede
é excepcional. De resto pode ter um problema
pontual de gestão e que estamos corrigindo isso
e dando todo apoio àquele profissional que por
acaso tenha tido algum tipo de dificuldade na sua
gerência, no seu dia a dia de uma unidade escolar.