Milton Campos
O doutor Milton Campos, um dos grandes nomes da UDN, intelectual brilhante, advogado, jornalista, foi deputado constituinte, governador
de Minas, senador, candidato a vice-presidente da República, ministro da
Justiça. Estava, certa vez, no aeroporto do Rio, quando se aproximou dele
uma sessentona, daquelas mulheres engajadas na política:
– Doutor Milton, eu sou da UDN, mas da UDN verdadeira: fui uma
das viúvas da rotativa e sou da UDN da calúnia! Da calúnia, doutor Milton,
como o senhor!
O fato é que Carlos Lacerda promovera uma campanha para comprar
uma rotativa nova para o jornal Tribuna da Imprensa: algumas senhoras
saíram pela Avenida Rio Branco com a bandeira da UDN esticada, e as pessoas jogavam, no meio da bandeira, suas contribuições. O Diário Carioca,
que era do PSD e contra a UDN, cognominou as senhoras quarentonas de
“viúvas da rotativa”.
Milton Campos, um padrão de correção ética, sorriu e disse:
– Persevere!
Ele tinha um espírito de ironia fina. Quando era governador de
Minas Gerais, houve uma greve de professores. O secretário da Educação
fez um relatório sobre a greve, informando que era grave no Município de
Divinópolis, e disse ao governador que era necessário determinar ao secretário de Segurança que mandasse um destacamento da Polícia para acabar
com ela.
Milton Campos respondeu ao secretário:
– Não, eu tenho outra solução: vou mandar o secretário da Fazenda
pagar o salário dos professores, que estão em greve pelo atraso de seus
vencimentos!
Seu chefe do gabinete civil era o Pedro Aleixo, muito seu amigo e figura das mais expressivas da política mineira.
Como era ele que executava as ordens do governador, contava-se, emMinas Gerais, a seguinte história: quando alguém queria falar com o governador Milton Campos, ele dizia:
– Fale com Pedro, primeiro.
Naquela época, Pedro Aleixo ficou conhecido como um dos Braganças:
Pedro I.
Quando Milton Campos foi candidato a vice-presidente na chapa de
Jânio Quadros, a votação para presidente e vice era independente. Isso fez
que Jango – João Goulart – promovesse o voto Jan-Jan, infelizmente vitorioso: podemos imaginar que, se Milton fosse o vice-presidente, não haveria
a crise de 1964 e o regime militar. O Jânio não contribuiu, durante a campanha, para desestimular o Jan-Jan. Apesar disso, ele e Milton muitas vezes
fizeram campanha juntos.
Jânio Quadros, em todos os lugares aonde chegava, fazia o mesmo
discurso, sempre com uma fórmula mágica para levantar as massas e levá-
-las ao delírio.
Certa vez, em Salvador, fomos a um comício, e o Jânio provocou o
Milton Campos:
– Doutor Milton, o senhor, em cada lugar, faz um discurso diferente.
O Milton Campos respondeu:
– É porque não tenho boa memória, governador.
Em Brasília, logo após a mudança da capital, as casas dos deputados
eram como repúblicas de estudante: nós nos reuníamos para bater papo
e, ao mesmo tempo, tomar alguns drinques. Uma dessas casas, que tinha
fregueses fixos, era a do Padre Godinho, brilhante orador e deputado por
São Paulo.
Um dia, na mesa de drinques, o Padre Godinho perguntou a todos:
– Está faltando gelo?
Milton Campos lhe respondeu:
– Não, Godinho, está faltando uísque!
Outra tirada do Milton Campos, como sempre cheia de ironia e
sabedoria, ocorreu durante um voo entre Rio de Janeiro e Vitória. O avião
enfrentou muita turbulência e jogou muito. A aeromoça chegou junto ao
Milton, que estava pálido e suava muito, e perguntou:
– Falta de ar, Doutor Milton?
– Não, falta de terra