A beleza do instante na poesia de Lourdes Sarmento

Lourdes Sarmento é uma poeta robusta, com preponderância sobre a linguagem. Sua poesia nivela-se pelo silêncio e, ao mesmo tempo, se engrandece pelo tumulto das imagens.

De repente, o seu leitor deleita-se com a riqueza dos presságios e com o murmúrio das águas. Subitamente, a poeta dispara os seus cavalos e o tropel é uma ciranda deslumbrante.

A poesia de Lourdes Sarmento se materializa através das mais delicadas palavras: pétalas, manhãs, girassóis, paixões, estrelas, pássaros, acácias, borboletas... A sensibilidade é a tônica em seu universo de símbolos. Admiro, sobretudo, a extraordinária capacidade com que Lourdes Sarmento tece a arquitetura verbal do instante. São sentimentos represados que o seu ser de beleza transforma em acontecimento estético: “Ninguém pergunta / o nome da minha dor. / Quem sabe a diferença / do vento que me reinventa? // Quem sabe o rio / que entrou no meu corpo / e nunca mais me deixou?”.

Tamanha beleza somente se opera quando se é vidente. Lourdes Sarmento é profética, genuinamente lírica e telúrica. A poeta detém uma robustez de estranhamento com origem íntima, que se revela ao chamado que vem do próprio existir, decerto, lembranças da infância e das constelações do tempo. Lourdes Sarmento escreve com uma alma a saltar pelos dedos. Seu ritmo é passional e de uma fluidez selvagem identitária. Seu registro também é divino, com suave devoção aos sonhos, que mergulham no ciclo das raízes em fuga.

Outra torrente encantadora do seu espetáculo metafórico é o erotismo. A poesia das sensualidades e dos desejos encontra potência nos sustos indicadores de vida. A experiência poética de Lourdes Sarmento é elevada. Poeta definitiva e amadaque dobra os lençóis da noite e entrega a claridade da memória aos que bebem do seu manancial de mistérios: “Como quem lembra o território da infância / e o ama / só o poema cobrirá de acácias / a casa construída / pedra sobre pedra / onde habito e sobrevivo / nela guardo a voz das pedras / e o casulo do meu silêncio.”.

Por Diego Mendes Sousa - Poeta e crítico.