Novembro, 2021 - Edição 273

Pandemia e pandemônio

“Cautela, toda cautela – é a palavra de ordem.”

A pandemia, de fato, arrefeceu por conta da vacinação intensa nesses últimos quatro meses. Mas um grave surto de influenza lhe sobreveio, acumulado com o aparecimento inesperado da variante ômicron, que a cada semana traz notícias preocupantes. Como o inesperado primeiro óbito anunciado há poucos minutos pelo premier Johnson, do Reino Unido.

Isso me obriga a refletir que o pandemônio está em progressão célere. E por conta de um evento quase inacreditável, também registrado pelos telejornais desta noite de segunda-feira: a falta de organização – e aí o pandemônio se instala subterraneamente – na exigência de fiscalização de passaportes de Covid-19 dos que desembarcarem no Brasil. O fato concreto, como informam especialistas como Margareth Dalcolmo ou Natalia Pasternak é que a variante ômicron aparece com mais de 50 mutações que a distinguem da cepa original, a delta. Estudos feitos há dias apontam duas maneiras de enfrentar esse fantasma assustador.

A primeira é cada cidadão correr e tomar a terceira dose das vacinas existentes no país. A segunda, puro delírio de uma noite de verão, é esperar por uma nova vacina específica contra a cepa invasora que se espalha velozmente pelo planeta. Descoberta, por óbvio, que só ocorrerá em alguns (muitos) meses. A esperança seria que a ômicron fosse mais contagiosa embora menos grave, ou seja, a tal gripezinha alcunhada por Bolsonaro ao começo da explosão da delta, que nos levou a mais de 600 mil óbitos nos trágicos últimos 20 meses. Ou quase isso, embora hoje em números cada vez mais decrescentes, o que merece entusiásticos vivas.

Eis o fato: a recomendação dos infectologistas indica que o Ministério da Justiça, ou quem administra nossas fronteiras, tome providências imediatas no sentido de barrar com a veemência possível a entrada de pessoas (nativos, ou em especial, estrangeiros) não imunizadas. Venho recebendo intensa correspondência nesse sentido, para esta coluna implorar ao capitão ordens imediatas para fechar fronteiras, em especial as aéreas. O que faço agora com fervor até por estar antecipando a defesa da nossa família e por certo a do presidente. Ou seja, do povo desse país agora em sobressalto, tal como amigos residentes na Europa e nos EUA me relatam, postos em grave ansiedade e insegurança. O óbvio é de fato temerário: tornar o Brasil num destino turístico antivacinas, o país coronavírus friendly. Isso me parece uma campanha política às avessas, só para tirar votos do presidente.

De fato, o ano que se encerra em poucos dias está coberto com pesadíssimas nuvens, a anunciada tempestade perfeita de vírus respiratórios chega antes do ansiado 2022. A influenza Darwin/h3N2 se alastra e já lota hospitais de norte a e sul, a partir do caminho aberto pelo relaxamento do uso de máscaras e do distanciamento social. Querem a equação matemática da tragédia já instalada? Fácil, fácil. É só seguir o Instituto Oswaldo Cruz, que testemunha claramente: nos últimos meses, com o avanço da vacinação, os casos de Covid-19 diminuíram muito e as medidas de proteção higiênica foram sendo “esquecidas”. Somando a isso, a taxa de vacinação contra a influenza caiu significativamente.

O Instituto ainda observa que a população já não aguenta mais tomar tantas e tantas injeções. É verdade. A Fiocruz assegura também que a influenza é uma doença grave e os infectados devem abandonar a ideia simplória de uma “reles gripezinha”. Ela ataca os pulmões e pode levar os infectados até ao óbito. Portanto, a Fiocruz se lança à frente em defesa da população e previne: todo cuidado com o réveillon será pouco, e com o Carnaval, então, nem se fala.

A agência insiste naquilo que muitos se recusam a aceitar. A pandemia não acabou, por isso a população e os dirigentes estão pisando em corda bamba. Todos em conjunto devem exercitar cautela e paciência, até porque as grandes celebrações em países infectados são seguidas de grandes contaminações.

Por Ricardo Cravo Albin - Membro da Academia Carioca de Letras.