Janeiro, 2022 - Edição 275

Aprendendo a cozinhar

Estou aprendendo a cozinhar a comida do dia a dia. E apaixonada por essa arte. Eu já era cozinheira de fins de semana, fazia um bacalhau à espanhola bem apreciado, e um ou outro prato. Ontem fui fazer o almoço, legumes no forno: no fundo do refratário um pouco de azeite e meias-luas de cebolas. No meio, uma cabeça de alho sem o topo, com as cascas. Em torno, fui arrumando pedaços de berinjela, abobrinha, macaxeira, cenoura, batata, batata-doce, abóbora, banana, pimentões coloridos e cebola em pétalas. Enfeitei com azeitonas abertas, dentes de alho, tudo foi regado com sal, azeite e pimenta do reino, um toque distante de pimenta calabresa. Deixei no forno por uns quarenta minutos, enquanto preparava um suco de maracujás com cenouras e mel, refrescante, misterioso. Para sobremesa, botei numa caçarola umas rodelas de abacaxi cobertas com uvas passas e tirinhas secas de casca de tangerina, deixei no fogo baixo com a panela tampada, e pronto. Delícias! Mas ficava pensando...

Cozinhar, nos dias de hoje, é algo que requer um conhecimento muito além da arte da culinária, do prazer dos sabores, da nutrição. Requer a consciência de viver no mundo. Devo, primeiramente, agradecer a bênção de não estar passando fome como tantas pessoas, em tantos lugares; devo ser comedida, simples e modesta. Reaproveitar tudo o que for possível, pensando sempre em dividir com a humanidade o que existe de alimento.

Devo escolher alimentos que não destroem a natureza nem que me trazem males. Não é difícil saber, está tudo na nossa rede de informações. Os alimentos devem ser na maioria do reino vegetal. Precisam ser da minha região, e devo preferir os da estação. Quanto menos processados, melhor. Devo levar em conta os preços e comprar produtos da minha cidade. Estudiosos dizem que, para se salvar e ao planeta, a humanidade precisa diminuir pela metade as carnes vermelhas e o açúcar na dieta e aumentar quatro vezes as frutas, verduras, castanhas e legumes.

Cientistas passaram a medir o impacto da comida em “pegadas de carbono”, ou seja, quanto de carbono é produzido em cada cem gramas da comida no prato. Os melhores alimentos, os que produzem menos carbono, são os vegetais plantados perto de onde vivemos. É bom que os alimentos sejam orgânicos, sobretudo no maltratado Brasil onde a cada dia são liberados mais e mais venenos para serem jogados nos nossos plantios. Devo comer aquilo que não precisou ser transportado em caminhões movidos a gasolina ou a diesel, e ainda menos o que precisou vir de avião por ser perecível.

Analisando o meu almoço: Ah, meu Deus, o meu azeite vem de Portugal... Mas vem de navio, pois tem longa vida. Os legumes e as frutas vieram de Mossoró, vieram de caminhão, mas daqui perto, mas não são orgânicos, mas a água lá é pura. As bananas, da vizinhança. O maracujá é de quintal. O mel é do seu Tatu, nosso mateiro. As cascas de tangerina são aproveitadas.

Está difícil encontrar o equilíbrio no nosso cardápio. O que dá para saber, na hora da escolha, é que os alimentos que fazem mal ao nosso corpo são os mesmos que fazem mal à Terra. E vice-versa.

Por Ana Miranda, premiada escritora, Doutora Honoris Causa pela Universidade Federal do Ceará, UFC.