Setembro, 2021 - Edição 271
Entrevista - José Augusto Minarelli
Entrevista transmitida em nível nacional, no Programa Identidade Brasil, apresentado por Arnaldo Niskier no canal Futura
Arnaldo Niskier: Sei que você tem uma formação em
Educação pela USP. A sua vida começou na cidade paulista de
Jaú. Conte um pouco sobre esse começo e como você chegou
depois ao CIEE.
José Augusto Minarelli: Em Jaú, cresci numa família
de classe média baixa e me defrontei com um problema de
educação, que é a escolha vocacional, muito cedo. Não sabia
exatamente para onde ir, sabia o que não queria e não sabia o
que havia de disponibilidade, não queria ser mecânico, não
queria ser contador. Uma vizinha, que era professora, recomendou que examinasse o Curso Normal, que era o nome da época
do Curso de Formação de Professores para ensino de primeiro
grau. Procurei uma escola pública muito conceituada na cidade,
Instituto de Educação Caetano Lourenço de Camargo, me inscrevi, passei e fiz o Curso Normal, me encontrei. Foi por inspiração
da orientadora educacional Dra. Gladys Piragi que me interessei
mais ainda por educação e mais ainda por orientação de alunos,
pessoas. Entrei na USP, fiz o curso de pedagogia, me pós-graduei
em orientação educacional. Então, sou um educador que acabou
tendo a sorte de descobrir um caminho que me deixa muito
feliz e construiu toda minha carreira. Chegando em São Paulo,
precisava estudar e trabalhar ao mesmo tempo, porque minha
família não podia manter-me. De dia, fui trabalhar num banco e,
de noite, ia para a Universidade de São Paulo na recém-construída Cidade Universitária. Uma verdadeira aventura, enfrentava a
escuridão dos campos de obra e lá tive a chance de ter excelentes professores e lá fora trabalhando. Saí de um banco, fui para
uma indústria, de uma indústria para o Centro de Integração
Empresa-Escola, onde entrei como auxiliar fazendo entrevistas e
encaminhamento de estudantes para os Estados.
Arnaldo Niskier: Tenho curiosidade em saber como
chegou o gosto pelo ato de escrever livros. Você tem livros muito
bem-sucedidos, como aquele chamado Empregabilidade.
Como é que você chegou a isso?
José Augusto Minarelli: Foi na escola com um professor
de português, oriundo de outra cidade, um ótimo professor.
Primeiro ele me ajudou a perder o /R/ (“carne verde”), típico
de caipira. Ele sempre nos ajudava, estimulava, ironizava esse
sotaque e, depois, com estímulo contínuo para a leitura e para
a escrita. Fui bom aluno de português, tomei gosto pela escrita
e tomei gosto por ensinar e uma forma de ensinar é ao vivo e
a outra, a distância. Nesse sentido, quando comecei a empresa
Lens&Minarelli, que se dedica a apoiar executivos a continuação
da carreira após uma demissão, senti que precisava escrever
os livros que continham a metodologia e exemplos que fui
colhendo e aprendendo com meus clientes. O primeiro livro foi
Empregabilidade, que é a condição de ser contratado e enfrentar
as transições de vida e carreira. Esse livro foi muito bem-sucedido, é vendido até hoje na versão e-book e teve 30 tiragens, é
uma edição expressiva. Depois, escrevi um livro sobre trabalhar
por conta própria, uma opção que pode dar certo. Escrevi outro
livro com o título Venda seu Peixe para ensinar as pessoas que é
necessário vender o seu serviço. Escrevi também Networking, na
versão comum e na versão de bolso, para ensinar o valor do cultivo dos relacionamentos para você tê-los à disposição quando
precisar resolver qualquer assunto da sua vida ou da sua carreira.
Escrevi Carreira Sustentável, e também um livro que acho muito
importante, com uma contribuição genuína, que é Inteligência
Mercadológica.
Arnaldo Niskier: Daí a força que você tem dado ao nosso
amigo Casagrande para a produção de livros na UNICIEE.
Você tem prestigiado muito a UNICIEE, que é a chamada
Universidade do CIEE, e os livros que têm saído são muito bons.
Agora mesmo acaba de sair um, você falou em marketing, sobre
a amplitude do marketing. Veja só como isso é oportuno neste
momento em que o conhecimento está posto em embaraços
por causa da Covid. O que representou a Covid na atuação do
CIEE? Atrapalhou muito?
José Augusto Minarelli: A Covid atrapalhou o mundo
inteiro, mas, junto aos problemas que a Covid trouxe, vieram os
desafios para que revíssemos estruturas, serviços, maneiras de
ser. No caso do CIEE, o grande benefício foi acelerar algo que já
vinha sendo gestado, que era a transformação digital de toda a operação do CIEE. A transformação hoje é absolutamente necessária para aprendermos mais, melhor, mais rápido. São milhares
de estudantes que depositam em nós a esperança do ingresso
no mercado de trabalho, pela via do estágio e do programa de
aprendiz legal.
Arnaldo Niskier:Você fala milhares. São quantos milhares aproximadamente?
José Augusto Minarelli: Na nossa fila aqui de São Paulo,
temos mais de 2 milhões de pretendentes e 400 mil que estão na
atividade. Há muita gente precisando do CIEE, temos feito um
esforço muito grande e a Covid nos obrigou a rever nosso procedimento, a tecnologia que usamos. Fizemos um investimento
grande, nos últimos anos, que foi acelerado pela Covid, e hoje
temos uma estrutura tecnológica que nos permite atender muito
mais estudantes. Estamos ainda trabalhando em casa, home
office, e por incrível que pareça, sob a liderança do Casagrande,
a operação não piorou, pelo contrário, melhorou, porque toda
a equipe se dedicou, entendeu o momento, se adaptou e fez o
melhor que podia.
Arnaldo Niskier: Isso está acontecendo no Brasil inteiro?
José Augusto Minarelli: No Brasil inteiro, em todos
os CIEEs independentes e o de São Paulo. Esse movimento de
inovação mantendo a tradição, que é importante, mas cuidando da inovação tem produzido, vai produzir resultados muito
melhores para o desenvolvimento dos jovens nesse período de
transição entre a educação e o fazer, a ocupação. Nesse sentido,
a tecnologia nos permitiu outra forma de atender às pessoas e
ir mais longe com a UNICIEE, que começou como uma universidade corporativa para desenvolver os próprios funcionários.
Mas essa estrutura, a equipe técnica da universidade corporativa
foi desafiada para dar suporte a um objetivo maior de expandir
a educação, a informação. A UNICIEE, hoje, tem programas
abertos para estudantes, para pessoas com empresa como uma
forma de oferecer mais oportunidades, fruto da qualificação, da
informação, da melhoria do desempenho e da atualização diante
de um mundo que se transforma.
Arnaldo Niskier: Dentro desse escopo, a palavra empreendedorismo ganhou uma força muito grande. Outro dia, conversava com o Marcelo Galo, que é uma figura importante, um
quadro importante do CIEE brasileiro, particularmente de São
Paulo, e ele também é muito fã das ações que se desenvolvem
em relação ao empreendedorismo. O que você acha disso?
José Augusto Minarelli: Há muitos anos, como missionário, venho falando em empreendedorismo e falo de forma
bem didática como professor que sou para convencer e angariar
mais súditos, mais adeptos para essa empresa. O fundamento é
o seguinte: todos nós precisamos trabalhar e ganhar dinheiro e o
trabalho vem do problema dos outros. Quando temos uma mentalidade mercadológica e entende que quanto mais problema
tiver, mais oportunidades de trabalho vão existir para quem tiver
um olhar diferente, uma fala diferente, um comportamento diferente, ou seja, um comportamento de empreendedor, daquele
que não precisa de chefe, não precisa de ordem para fazer, mais
gente vai ter trabalho e remuneração. Nas transformações que
estamos vivendo no mundo, estamos e vamos continuar assistindo a uma redução dos empregos formais, não extinção, como
muitas pessoas dizem. O mundo sempre terá emprego, mas não
terá emprego para todos os pretendentes, mas problemas não
faltarão. Aquelas pessoas que desenvolverem a capacidade de
empreender, de identificar necessidades, de desenvolver serviços
ou produtos, de vendê-los, e aí tem um aspecto importante que
tem sido uma bandeira minha, que é ensinar a vender, estaremos
dando oportunidade às pessoas de ter trabalho e remuneração,
que é o que precisa. As pessoas não precisam de um emprego e
do salário. Precisam do trabalho, da oportunidade de trabalhar e
da merecida recompensa financeira, isso se chama salário, mas
pode ter outro nome. Enfatizei, dentro da bandeira do empreendedorismo (o CIEE agarrou, está levando a sério), que essa é uma
forma de dar oportunidade para as pessoas que não terão um
emprego formal, infelizmente. O emprego formal, claro, é mais
confortável, porque tem estrutura, um chefe, alguém que vende
o serviço. Mas a pessoa que aprende a empreender – e nesse sentido o CIEE vai ajudar muito – adquire autonomia, porque sabegerar trabalho e ganho. Tem um aspecto que tenho me dedicado
muito que é ajudar as pessoas a entenderem o ato de venda de
uma forma diferente, porque fomos educados para ter vergonha
de vender, ter vergonha de dar preço, mas, na verdade, todos nós
somos e precisamos ser vendedores, e ser vendedor não é feio,
desde que você faça de forma correta.
Arnaldo Niskier: Por que os milhares de aprendizes e
estagiários do CIEE estudam de graça? Eles têm a gratuidade
como uma norma. O que você acha disso?
José Augusto Minarelli: O CIEE é uma organização de
assistência social criada e mantida pelo mundo privado, entidade do mundo organizacional, mantida por empresas e pelos
serviços que presta. As pessoas pensam que o CIEE é do governo, que vive de doação. Não vive de doação nenhuma. Vive do
dinheiro que arrecada com serviços prestados para as empresas,
portanto é uma grande organização de assistência social que
trabalha como uma empresa privada mantendo (como você bem
sabe, porque é membro da governança corporativa) os melhores
padrões de gestão do mundo privado. O governo, as empresas
privadas, as organizações são clientes, pagam pelos serviços que
oferecemos gratuitamente aos jovens. Os jovens que atendemos
são os menos favorecidos, da periferia, das várias categorias
menos favorecida da população e eles precisam de oportunidades, porque não nasceram em berço de ouro, não estudaram nas
melhores escolas.
Arnaldo Niskier: Principalmente ao fato de que essas
oportunidades constituem o primeiro emprego da vida dessa
gente. Olha como isso socialmente é importante.
José Augusto Minarelli: O Brasil tem uma riqueza enorme, que é sua juventude. O CIEE está todo ligado ao que nosso
presidente Casagrande fala: “Toda nossa ação é dirigida a jovens,
porque jovem é talento, é vir a ser, é moldável, é gente que está
sedenta por oportunidades.” Então, os programas do CIEE são
a primeira oportunidade, pé no mundo do trabalho, a transição
segura da escola para a vida, da teoria para a prática e o início
de uma carreira. Quando você dá oportunidade para quem tem
necessidade, essa pessoa se dedica de corpo e alma a estudar,
a fazer, a crescer. Temos histórias maravilhosas que advém de
pessoas que se tornaram importantes, porque tiveram a primeira
oportunidade gerada pelo CIEE.
Arnaldo Niskier: Ouvimos isso e, evidentemente, ficamos orgulhosos. Acaba de ser lançado pelo CIEE, iniciativa do
Humberto Casagrande, com nosso apoio, um livro chamado A
Amplitude do Marketing. Como autor, como intelectual, como
líder desse movimento, o que você acha da aplicação dos conceitos de marketing em todo esse processo?
José Augusto Minarelli: Marketing deveria fazer parte do
pensamento, da formação e da ação de todo profissional. Tudo
que fazemos é para os outros e dessa interação é que as oportunidades para os profissionais são geradas. A pessoa que tem
o raciocínio mercadológico (o que explico com detalhes no meu
livro Inteligência Mercadológica) tem um jeito diferente de olhar,
de ouvir, de falar, de interagir. Todos nós somos prestadores de
serviços para os outros e os outros precisam saber que existimos, o que fazemos, o benefício adquirido, quanto custa, onde
estamos, para poder nos contratar. Precisamos uns dos outros e,
nesse sentido, todos os componentes do marketing, a partir da
mentalidade e dos procedimentos ligados à comunicação, que
exige marketing impessoal, comunicação intencional, venda,
interação com clientes, são fundamentais para se ter sucesso
na carreira, para termos trabalho, remuneração, oportunidades,
criar empreendimentos geradores de empregos e criar, pelo
exemplo, outros empreendimentos de gente jovem. Então, esse
livro nasce em boa hora e está alinhado com esse trabalho de
suporte ao empreendedorismo para oferecer aos jovens que não
vão encontrar um emprego convencional uma ampla avenida
que não tem fim. Sou fã inveterado do empreendedorismo, porque problemas nunca vão acabar e são os problemas que geram
oportunidades de prestar serviços ou de construir bens, mas para
isso tem que ter a mentalidade mercadológica.
Arnaldo Niskier: Como educador, formado pela USP,
como vê o ensino híbrido que hoje está em curso por causa da
Covid?
José Augusto Minarelli: Vejo com bons olhos e essa
também é uma contribuição da Covid, porque o ensino híbrido não é novo. Há muitas iniciativas antigas, há iniciativas no
exterior, algumas até com o nome meio curioso. Quando eu era
funcionário, gostávamos de encaminhar estudantes para organizações com o ensino sanduíche, tinha teoria e prática, teoria e
prática, teoria e prática. Um pouco na escola, um pouco dentro
da indústria, no caso. A Covid trouxe essa necessidade de ir para
casa e de as pessoas aprenderem que podemos aprender e executar o trabalho em qualquer lugar, desde que tenha os recursos
tecnológicos e saiba usá-los. Estamos gravando este programa
aqui graças aos recursos tecnológicos que, hoje, são acessíveis
e permitem nos comunicarmos, nos encontrarmos, nos relacionarmos. Agora, há um período de aprendizado. Este ano, não
só na medicina, na educação, na gestão de empresas, todos nós
fomos pegos de surpresa e estamos aprendendo ainda os novos
procedimentos. Na medicina, por exemplo, infelizmente, os primeiros doentes foram cobaias, foram tratados por médicos que
não sabiam como enfrentar. Tentaram, agora aprenderam.
Arnaldo Niskier: Felizmente começa, agora, a ser dominada.