Junho, 2021 - Edição 268
A Eneida, em português de hoje
Homenagem a Walter Medeiros, um açoriano natural do Nordeste
e que foi catedrático da Universidade de Coimbra, ao ser publicada a
tradução de uma das epopeias da antiguidade clássica e que influenciou Camões na estrutura d’Os Lusíadas.
A tradução da Eneida, por Carlos André, permite a aproximação,
muitas vezes de acesso difícil, do poema épico de Virgílio, uma das epopeias da antiguidade clássica que fixou as raízes políticas e culturais de
Roma e teve a mais ampla repercussão na Europa, da Idade Média e do
Renascimento. Os Lusíadas representam, no caso português, a referência mais emblemática.
A Eneida, em português de hoje, é uma tradução rigorosa dos
sucessivos cantos que narram e exaltam, entre muitos outros episódios,
a instalação dos troianos, a fundação territorial de Roma, as características dominantes da sua expansão, os amores de Dido e a descida de
Eneias aos infernos. Tudo quanto celebrou um ideal de civilização e de
esplendor e, ao mesmo tempo, um paradigma de beleza, que passou à
História associada ao século de ouro do imperador Augusto.
Contudo, a tradução rigorosa da Eneida por Carlos André –
professor catedrático da Universidade de Coimbra e sócio efetivo da
Academia das Ciências – não significa uma versão fria, seca, hirta, condicionada aos padrões vernáculos e áridos da língua portuguesa, num
estilo destituído da agilidade e da fluência indispensáveis para estabelecer uma comunicação direta com o leitor contemporâneo.
Estamos perante uma Eneida que segue o texto original, sem resvalar no aparato retórico a que, habitualmente, se recorre para caracterizar as expressões heroicas de fervor cívico e de exaltação patriótica.
Também não deriva para as efusões sentimentais que envolvem osestados de angústia, de intimidade afetiva e as metamorfoses da paisagem.
Num exaustivo trabalho de recriação poética, que se prolongou
durante seis anos, Carlos André manteve exemplar sobriedade verbal e
as singularidades da obra que define a identidade literária de Virgílio.
Um dos expoentes da língua e literatura latinas que se evidenciara, em
vida, com as Geórgicas e as Bucólicas e, após a morte, com a revelação
da Eneida que logo virou celebridade universal.
Esta tradução de Carlos André é dedicada à memória do seu mestre, na Universidade de Coimbra, o catedrático Walter Medeiros – um
açoriano natural do Nordeste – é uma das homenagens devidas a um
dos mais injustamente esquecidos humanistas portugueses do século XX.
XX.