Maio, 2021 - Edição 267

Entrevista - Calos Alberto Serpa

Entrevista transmitida em nível nacional, no Programa Identidade Brasil, apresentado, por Arnaldo Niskier, no Canal Futura
Nasce a Academia Brasileira de Cultura

Arnaldo Niskier: Recebemos, com muito prazer, a visita, via internet, do professor Carlos Alberto Serpa de Oliveira, presidente da Fundação Cesgranrio. Ele nos deu uma notícia em absoluta primeira mão: a criação, no Rio de Janeiro, da Academia Brasileira de Cultura. Gostaria que o professor Serpa nos contasse quais são os propósitos da Academia Brasileira de Cultura.

Carlos Alberto Serpa: Sabemos que a cultura está passando momentos muito difíceis em nosso país, as pessoas desprezam a cultura, está sendo deixada de lado, nossos artistas, nossos escritores, todos têm imensa dificuldade de realizar e mostrar seu talento. Então, resolvemos nos dar as mãos para brigar pela cultura, defender a cultura, realizar grandes projetos.

Arnaldo Niskier: Você sempre fala que, sem uma cultura forte, a educação também não acontece. A educação é uma variável dependente da cultura como aprendemos nas nossas aulas de matemática, eu no meu curso, você, no seu, de engenharia. Carlos Alberto Serpa: Em quase 50 anos de vida, passaram por nós mais de 200 milhões de alunos e, no princípio da criação da Cesgranrio, acompanhávamos não só o desempenho no vestibular, mas também como se desenvolviam nos estudos acadêmicos na universidade e até, com uma pequena amostra, como se desempenhavam na vida profissional depois. Havia um grupo pequeno cujo desempenho era tão bom ou maior até do que aqueles de alto poder aquisitivo, embora estivessem na camada inferior das classes sociais.

Arnaldo Niskier: Como se explica isso?

Carlos Alberto Serpa: Em casa, eles tinham cultura de manhã até de noite. Você é um estudioso e sabe que educar significa tirar de dentro para fora com as habilidades hoje denominadas socioemocionais, que fazem com que a educação se complete de forma mais eficaz e mais rápida. É por isso que a cultura é indispensável para a formação dos indivíduos e por isso que a Fundação Cesgranrio tanto se empenha em fazer da cultura um dos seus projetos essenciais, especialmente nas escolas públicas. E, por falar nisso, a nossa Academia Brasileira de Cultura já tem até seu fardão na cor vinho e o colar acadêmico. Na verdade, anima a todos que batalham na educação, nas suas mais de 12 áreas da cultura, a estar juntos de mãos dadas brigando por esse binômio.

Arnaldo Niskier: Quem é que criou esse fardão?

Carlos Alberto Serpa: Dei uma ideia para nossa querida (e futura confreira, porque ela também está na Academia Brasileira de Cultura) Hildegard Angel, do Instituto Zuzu Angel, e o colar foi bolado pelos técnicos aqui da Fundação Cesgranrio, tendo à frente dois rapazes muito talentosos, o Elton e o Victor Zotti.

Arnaldo Niskier: Tanto o fardão quanto o colar são muito bonitos. Já tem data para a posse da ABC?

Carlos Alberto Serpa: Primeiro preparamos o ambiente, já temos uma sede muito bem montada com todos os requintes acadêmicos que você tão bem conhece e vivencia na ABL. Na verdade, a cerimônia de posse tem que ser presencial, senão tira todo o brilho e toda a efetividade. Vamos ver se no 1º trimestre de 2022 conseguimos fazer isso presencialmente.

Arnaldo Niskier: A Fundação Cesgranrio é a responsável logística pela realização do ENEM e vem aí uma grande novidade, o ENEM digital. Gostaria que o professor Serpa nos contasse sobre o ENEM digital. O que é isso?

Carlos Alberto Serpa: É o ENEM feito através de computador, as provas não serão mais impressas, aparecerão nos computadores das escolas selecionadas. Para isso, fizemos um pré-teste, no ano passado, para estudar, testar, pesquisar e garantir a privacidade, para que não haja hackers invadindo na hora da prova e não haja nenhuma possibilidade de fraude, de formas muito bem-sucedidas. Teremos a grande maioria fazendo a prova tradicional, mas temos hoje a convicção, graças aos estudos e pesquisas da Fundação, que há comparabilidade entre as provas impressas e as digitais. Esses estudos foram possíveis por causa do pré-teste que fizemos.

Arnaldo Niskier: Quem é que organiza as questões?

Carlos Alberto Serpa: No passado, também a Fundação o fazia, mas já há muitos anos quem o faz são os professores contratados pelo INEP, Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos do MEC.

Arnaldo Niskier: O que é TRI?

Carlos Alberto Serpa: É a Teoria de Resposta ao Item. É uma maneira que temos de poder comparar as provas de cada aluno. Isso quer dizer o seguinte: posso fazer uma prova hoje aqui e fazer uma prova amanhã para outra pessoa lá. Essas provas hoje são comparáveis por esse sistema que adotamos, que já estava em vigor nos Estados Unidos. Logo no início desse estudo, nos Estados Unidos, estudamos também aqui e hoje aplicamos no Brasil. Então, provas diferentes são comparáveis.

Arnaldo Niskier: Você acha que há um progresso na qualidade do aluno nesses últimos anos? Nossos alunos estão sabendo mais do que os alunos de antigamente?

Carlos Alberto Serpa:Há situações pontuais no Brasil. Estados, como o Ceará, fizeram grande progresso nesse sentido.

Arnaldo Niskier: Desde o ensino elementar o Ceará brilha.

Carlos Alberto Serpa:Isso serve de exemplo para os outros estados. Gastamos muito, mas gastamos mal em educação. Temos que investir na formação dos nossos professores, naquela possibilidade de ter o ensino presencial ligado às atividades que desenvolvam as qualidades socioemocionais dos alunos. Há um pequeno progresso, mas muito inferior àquilo que deveria acontecer, se você examina o volume de recursos que gastamos em educação no Brasil. O Brasil está entre os cinco países que mais gastam em educação no mundo.

Arnaldo Niskier: E a formação de professores que é a nossa seara maior? Você acha que melhoramos?

Carlos Alberto Serpa:Isso ficou muito comprovado agora quando vimos, nessa pandemia, a necessidade de fazer o ensino a distância, através dos computadores, e vimos que os professores não estavam treinados para esse tipo de educação. Creio que esse tipo de miscigenação entre o ensino presencial e o ensino a distância veio para ficar.

A PEDAGOGIA

Arnaldo Niskier: Você não acha fundamental que os cursos de pedagogia sejam amplamente reformulados?

Carlos Alberto Serpa: Acho sim e até já fizemos aqui dentro da Cesgranrio um grande simpósio dedicado apenas a isso. Como deveriam ser os novos cursos de formação de professores em nosso país. Pena que ainda não se colocou isso em execução. Precisamos urgentemente modificar esse processo de formação e fazer com que essa profissão seja mais procurada, isso passa também pela remuneração do salário dos nossos professores, temos que corrigir isso.

Arnaldo Niskier: O professor Serpa vai presidir a Academia Brasileira de Cultura, mas ele já é, há muitos anos, o presidente da Academia Brasileira de Educação. Você vai trocar uma pela outra?

Carlos Alberto Serpa: De jeito nenhum. A educação para mim é sempre aquela que me realiza enquanto professor, educador, como engenheiro que sou, mas de homens, de pessoas. A Academia de Educação está apoiando totalmente a cultura, elas vão inclusive quase que trabalhar em prédios geminados, vão estar muito juntas, espero que assim seja.

Arnaldo Niskier: Você lembra dois ou três itens desse projeto de aperfeiçoamento do ensino superior?

Carlos Alberto Serpa: Primeiro, é claro, a formação de professores, o ensino mais integral, com mais horas de ensino, quer dizer, a mudança do paradigma das matérias que têm que integrar e as atividades que têm que integrar o processo de formação são as mais importantes entre elas, e o financiamento da educação que também é básico. Agora, na Academia de Cultura, queria citar você como primeiro convidado que foi para integrar a Academia. Na verdade, logo depois de você, vieram Nélida Piñon, Arno Wehling, Marcos Vilaça, Domício Proença, Gabriel Chalita; na música popular brasileira, temos desde Elza Soares até Zeca Pagodinho; na moda, que também é uma forma de cultura, temos Hildegard Angel, Margareth Padilha, Beth Serpa (minha mulher), Carlos Tufvesson; nas artes plásticas, temos a grande escultora Marília Azevedo; no cinema, temos o Cacá Diegues; no teatro e na TV, temos Walcyr Carrasco, Wolf Maia, Marieta Severo, Christiane Torloni, Lilia Cabral, Rosa Maria Murtinho, Stepan Nercessian; como grandes produtores culturais, temos o ex-ministro da Cultura Marcelo Calero, temos Eduardo Barata, presidente da APTR, temos o Cláudio Magnavita, que recriou o Correio da Manhã, temos Ricardo Cravo Albim, presidente do Pen Clube, que tem vasta lista de serviços prestados à cultura, temos Isaac Karabtchevsky, nosso grande maestro na música clássica, Carol Murta Ribeiro, grande concertista; na dança clássica, nossa querida Ana Botafogo, Dalal Achcar e, na dança popular, temos Carlinhos de Jesus, isso entre quarenta acadêmicos que já aceitaram e estamos na reta final. A Academia deve fechar com 45 membros, mais ou menos, e aí poderemos marcar para, presencialmente, colocar de pé a Academia Brasileira de Cultura.

Arnaldo Niskier: O Brasil deve a você um parecer histórico, lembro bem, criando os cursos técnicos especializados em nível, na época, de segundo grau. Eu, como secretário de Educação e Cultura, cheguei a implementar alguns desses cursos: estruturas navais, administração de empresas. Uma pena que isso tenha sofrido, como tanta coisa boa no Brasil, solução de continuidade.

Carlos Alberto Serpa: No nosso estudo da Academia vai propor.

Arnaldo Niskier: Claro, porque deu certo e acho que há um campo imenso para que essas coisas aconteçam, sobretudo porque virão muitos cursos novos com a tecnologia digital.

Carlos Alberto Serpa: Você lembra, quando juntos estávamos no Conselho Nacional de Educação, que criamos isso sob o nome de pós-secundários não universitários e hoje a Academia tem o privilégio, e isso vai nos ajudar muito a implementar nossas ideias, de ter uma das nossas confreiras, Maria Helena Guimarães Castro, presidindo o Conselho Nacional da Educação e ela comunga das nossas ideias da Academia Brasileira de Educação.

Arnaldo Niskier: Ela é uma educadora muito competente, com grande traquejo dentro do Ministério da Educação, e esperamos que continue iluminando os caminhos do ministro da Educação, pois precisamos que isso se estabeleça com competência e rapidamente.

Entrevista transmitida em nível nacional, no Programa Identidade Brasil, apresentado, por Arnaldo Niskier, no Canal Futura.