Abril, 2021 - Edição 266

Escravatura e racismo. Negros e judeus.

Depois da fuga do Egito, para se livrar da escravatura, o povo judeu continuou a saga do sofrimento por longos anos, de pogroms a perseguições, até o morticínio do terrível holocausto. Os negros permaneceram lá, abanando as várias cleópatras, rainhas menos famosas, e preenchendo, também, os diversos períodos da humanidade, com histórias de dor e exploração.

O holocausto marcou o início de uma era diversa. Não mais a aceitação silenciosa contra ações impostas pelos poderosos e odiosos extremistas. Não mais ao silêncio contra as agruras sofridas. Nem uma simples frase ofensiva será suportada. Um revés mais do que proporcional será ouvido e repetido. Uma agressão a um judeu ou a uma Sinagoga, qualquer que seja a ofensa, será rebatida firmemente. A ADL (Anti Defamation League) é uma organização mundial, com base nos Estados Unidos, que cuida de identificar qualquer manifestação anti-judaica e assume reações oportunas e necessárias. Em todos anos da história da sociedade humana, a tristeza e o martírio dos negros foi uma constante vergonhosa. Vergonhosa e aceita por todos os nós da exploração. Dos políticos aos padres. Dos mais instruídos aos ignorantes. Dos mais ricos aos mais pobres. Em termos de sofrimento, negros e judeus empatam.

A diferença maior e mais contundente é a forma de reagir. A contribuição de Martin Luther King na luta pela igualdade racial no Estados Unidos foi pouco imitada nos países que, também, testemunharam e testemunham injustiças crescentes contra os negros. Se pudéssemos tomar o Brasil como exemplo veremos que poucas manifestações de importância têm sido realizadas contra o mal terrível do apartheid sócio econômico imposto aos afro-descendentes. Em todos os ítens de desenvolvimento humano, encontraremos a face terrível desse mal: Educação, Saúde, Justiça e Segurança.

Qual negro brasileiro se destaca nesta luta impostergável? No Rio de Janeiro, uma homenagem em forma de um busto colocado na mais tradicional avenida da cidade, do discutido Zumbi dos Palmares (ele ou Ganga Zumba?), parece ter atendido aos que não aceitam a realidade da injustiça. Apenas algumas notas na imprensa no dia 20 de novembro, um feriado em algumas cidades, lembram a data da sua morte. Depois disso, nada. Dias depois da propagação do slogan americano “black lives matter”, em reação a um terrível assassinato nos Estados Unidos, uns poucos imitadores espalharam placas pelas cidades. Depois disso, nada. Desde 1695, séculos se passaram e não vimos continuadores na luta dos “quilombolas” pernambucanos. Quem se lembra, em simples recall, de um líder negro brasileiro atual? Quem conhece uma ação coordenada dirigida a discutir, como voz única, a situação dos negros e do preconceito.

Algo importante vem acontecendo agora, graças ao esforço da FIFA (logo os europeus, patrocinadores do transporte e venda de escravos durante séculos). Todos atos racistas praticados no âmbito dos jogos (antes, durante e depois) são execrados publicamente e os autores punidos severamente sob diversas formas. É necessário que o esforço antirracista se imponha com organização, fundos e trabalho coordenado. A busca de manifestações racistas de qualquer fonte e o seu desmascaramento, com repulsa e publicação dos nomes dos autores e, principalmente, seu encaminhamento à justiça, é um passo que não pode ser adiado. Contentar-se com reações esporádicas a atos praticados contra os negros é permitir que esta desgraça se eternize. Todos os dias, nos locais de trabalho, nas escolas, nos meios de transporte, nos hospitais, nas praias são cometidos crimes brutais de fundo racista. Como são pequenos na aparência, são deixados para trás. Engano suicida. É a soma desses atos que nutre o mal. Estimula sua repetição. A cada ato racista uma resposta firme, pública e legal, trará resultados muito mais importantes e com grande contribuição à memória popular.

Por Antenor Barros Leal - Ex-presidente da Associação Comercial do Rio de Janeiro..