Dezembro, 2020 - Edição 262

Taj Mahal

Confesso de público minha grande admiração pelo Taj Mahal, que considero uma das mais belas construções do mundo. A Unesco fez-lhe justiça, declarando-o Monumento Cultural da Humanidade. É um esplendor de beleza, o principal cartão postal da Índia. O cartão-postal da Índia por excelência.

Mas vamos por partes, saboreando devagar essa perfeita maravilha, esse alumbramento que encanta os estetas do mundo inteiro. O palácio- -mausoléu recebe – em tempos normais – cerca de sete milhões de visitantes por ano, dos quais três milhões são estrangeiros.

De Nova Délhi, capital da Índia, a Agra, a viagem de avião (que nunca fiz, nem mais farei) dura 40 minutos. Agra é a antiga capital do Império Moghul. Baber, o Grande, descendente do terrível Gêngis Khan, invadiu a Índia em 1526, ali estabelecendo a dinastia Moghul, de sangue mongol, portanto. A Mongólia aumentava seus domínios além das estepes. Os invasores professavam a religião islâmica (ou muçulmana) e sua língua e cultura eram persas. Consta que o Moghul foi um império de glória e de elegância, apesar das truculências guerreiras.

É em Agra que fica o sedutor monumento que pranteia a morte e, ao mesmo tempo, celebra a vida feliz que passou. O xá (imperador) Jahan foi o 4º monarca daquela dinastia de origem mongol e de cultura persa. Nasceu em 1592 e morreu em 1666. De suas quatro mulheres, a favorita era Arjumand Begum, que se tornaria imortal com o nome de Muntaz Mahal, que significa “orgulho do palácio”, pois era bela, inteligente, boa conselheira do marido e querida do povo por sua caridade. Morreu por complicações no parto do 14º filho, em 1631. Tinha apenas 39 anos de idade.

Desolado, inconsolável, o imperador apaixonado entregou-se às lágrimas e à solidão. Deixou de usar as vestes reais e nunca mais abandonou o luto. Ordenou que se construísse um túmulo para sua bem-amada, com a seguinte instrução: “Que não seja fúnebre, pois deverá celebrar a curta vida de um amor. A sua beleza e graça haverão de recordar eternamente a mulher, sem envelhecer. Será um sonho de mármore edificado na fronteira delicada entre o real e o irreal, como a própria paixão.”

Ele queria um monumento suntuário, de rara e original beleza. E assim aconteceu. Os arquitetos foram os persas Ustad Isa e seu discípulo Ustad Ahmal. As formas do minarete são claramente muçulmanas, árabes; as cúpulas obedecem a um desenho asiático trazido pelos moghul; os motivos decorativos são flores geométricas e flores persas. Segundo os historiadores e exegetas, o que há de mais hindu no deslumbrante monumento são o mármore branco e a estranha forma de pequenas torres que foram colocadas em torno da cúpula principal. Durante 17 anos, milhares de operários trabalharam sob a orientação dos melhores artesãos da Índia, Pérsia e Afeganistão. Tamanha perfeição estética custaria, hoje – discorrem os entendidos – cerca de 100 milhões de dólares.

O mármore veio do Rajastão, hoje um estado indiano que faz fronteira com o Paquistão. Os 43 tipos diferentes de pedras foram levados do Tibete, China, Pérsia e Rússia. Com detalhes de marfim e contendo pedras preciosas incrustadas nas paredes, esse palácio constitui um imenso túmulo de mármore branco de perfeitas proporções, para abrigar o corpo de uma mulher muito amada. Os poetas o denominam “um sonho em mármore”. O monumento ficou pronto em 1648 e é composto por três cúpulas, quatro torres laterais e um belo espelho d’água frontal. É o túmulo mais bonito e suntuoso do mundo. Uma abóbada cobre o centro da construção. Trechos do Alcorão – o livro sagrado dos muçulmanos – ornamentam a parte externa.

O palácio tumular está no meio de um jardim, onde a água dos lagos artificiais – o espelho d’água – reflete o esplendor de uma obra- -prima. Jahan ainda planejou erguer uma construção semelhante para abrigar seu próprio corpo após a morte. Um dos filhos do imperador apossou-se do trono, pela força das armas, depondo-o. E quando o velho monarca morreu, sepultaram-no ao lado de sua amada Muntaz Mahal, ou Arjumand Begum. A morte os separou, a morte os uniu novamente, num movimento pendular entre Eros e Tânatos. Uma construção como essa, de tamanha e tão delicada magnificência, de tirar o fôlego da testemunha ocular; uma graciosa câmara mortuária em feição de palácio, como essa, não poderia deixar de constar, como verbete , do livro best-seller mundial 1.000 Lugares para Conhecer Antes de Morrer, que tenho à cabeceira da cama, como um vade-mecum.

Sua autora é a americana Patricia Schultz e a tradução aqui no Brasil é de Cláudio Figueiredo e Pedro Jorgensen Filho, para a Editora Sextante, Rio, 2006. A edição brasileira ocupa 729 páginas em letras miúdas.

Sim, é claro, lá está o Taj Mahal, nas págs. 601 e 602, onde a autora declara que o monumento é “a encarnação da elegância e do romance, do equilíbrio e da simetria, um ícone arquitetônico há três séculos e meio venerado como o mais belo edifício do mundo”. E aduz: “O xá Jahan, grande soberano muçulmano da dinastia mogul, mandou construir o Taj Mahal inteiramente com mármore branco, como monumento funerário em honra à sua adorada rainha Muntaz Mahal, que morreu ao dar à luz o décimo quarto filho do casal em 19 anos. Um desses herdeiros acabou depondo Jahan, que foi aprisionado no Forte Agra, situado nas proximidades. De seus aposentos, ele podia admirar o Taj Mahal e chorar a perda de sua mulher e de seu império.”

Em seguida, a autora fornece informações turísticas sobre o local, onde se estabeleceu o sofisticado Hotel Amarvilãs, termo sânscrito que significa “céu eterno”. Patricia Schultz informa ainda que o local, em Agra, fica a 198 km de Nova Délhi, a 3 ou 4 horas de carro ou ônibus e a 2 horas no luxuoso trem Taj Express.

E aqui, benévolos leitores, termina a história dessa paixão imortal. Parece um conto das Mil e Uma Noites, narrado ao sultão pela linda Sherazade, sob o céu de Bagdá. Só não termina a glória de Jahan e Muntaz. Eles permanecerão juntos até o final dos tempos e o Taj Mahal continuará sendo o esplendor dos esplendores construído pela mão do homem. Louvado seja o Altíssimo, que preserve pelos séculos dos séculos esse poema de amor em mármore e ouro.

Por Danilo Gomes - da Academia Mineira de Letras.